A morte de Michael Brown por um policial em Ferguson, no Missouri, mostrou que, no ano do cinquentenário da Lei dos Direitos Civis, negros americanos ainda são mais expostos à violência policial e à prisão.
A morte de Michael, de 18 anos, um adolescente negro, suscitou uma série de protestos que expuseram, mais uma vez, quão delicada ainda é a questão racial nos Estados Unidos. As estatísticas do Departamento de Polícia de Ferguson mostram como é complicada a questão racial na cidade. Em 2013, por exemplo, a polícia parou 686 carros dirigidos por brancos e 4.632 por negros.
Passados 50 anos da promulgação da Lei de Direitos Civis e mais de 20 do auge das ações afirmativas, durante o primeiro governo Bill Clinton, Ferguson parece extremamente segregada. A maioria das autoridades municipais é constituída de brancos e, apesar de não ser como era a segregação que existia até os anos 1960, a desigualdade social e racial ainda subsistem nos Estados Unidos, e mesmo em regiões consideradas mais cosmopolitas. Os dados de Ferguson se repetem ao longo do país. Isso resulta em dados que demonstram que nos Estados Unidos a probabilidade de que negros (e hispânicos) sofram repressão policial é muito mais alta em comparação com a população branca. Este descaso pode trazer sérias consequências no futuro.
Ferguson suscita três temas: o racismo, a militarização da polícia estadunidense e a crescente desigualdade social. Nos últimos 40 anos os Estados Unidos têm observado uma inédita acumulação de poder econômico por uma pequena elite que cada vez mais detém o poder político do país. Os índices de desigualdade social no país são preocupantes. O Meio-oeste é diretamente atingido pelo processo de desindustrialização em progresso há algumas décadas, o qual gera muito desemprego entre os operários, profissionais sem grande qualificação que encontram dificuldade de encontrar nova colocação. Ainda assim, o meio-oeste possui uma taxa de desemprego parecida com a média nacional segundo dados oficiais do Governo. O fato de isto não ser visto em programas de grande audiência tem a ver com a certa aversão da mídia estadunidense por assuntos como desigualdades sociais e diferenças de classe, pois isto vai contra o mito do sonho americano. É também por causa dessa realidade de silêncio quanto ao empobrecimento do país e sumiço de sua classe média que o artigo do astro do basquete Karrem Abdul-Jabbar, na revista Time, no qual ele coloca a questão social e de classe acima inclusive da racial na análise sobre Ferguson, ganhou tanta projeção.
Além dos negros, outros segmentos da sociedade americana têm motivos para se preocupar. O número de imigrantes deportados no governo Obama, especialmente latino-americanos, é alto. O governo Obama tem sido mais duro com os imigrantes do que o próprio governo Bush, o que seria impensável nas eleições de 2008.
Há 51 anos, num agosto abafado, um homem proferiu um discurso pungente nas escadarias do Lincoln Memorial, em Washington, capital dos Estados Unidos. “Eu tenho um sonho de que meus quatro filhos viverão um dia numa nação onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas pelo conteúdo de seu caráter”, disse o reverendo Martin Luther King, Jr.