Diferente da escola anterior (Romantismo), o movimento literário do Realismo rompe com a idealização romântica e a linguagem subjetiva, visando retratar o homem situado em seu cotidiano, as relações por interesse, o elemento feminino analisado por outra perspectiva e uma tendência ao regate ao objetivismo.
A PROSA REALISTA
Como o próprio nome da escola já pressupõe, o Realismo lida com fatos, com a realidade do homem e a sociedade em conjunto. Desvinculando-se da subjetividade romântica e da relação onírica do movimento romântico, o realismo busca se expressar de maneira direta e crítica, expondo a hipocrisia das relações e os falsos valores morais.
A prosa realista possui caráter descritivo e a presença de muitos adjetivos, voltados a capturar o real como ele é. Sua principal temática é o amor, pois visa desconstruir a visão idealizada romântica e o sentimento de vassalagem. Nesse sentido, o amor platônico pela figura feminina é desconstruído e a mulher passa a ser retratada com qualidades concretas, mas são os seus defeitos que ganham destaque pelo narrador, assim como suas mentiras e seu caráter destemido.
Além disso, há uma exposição da falsidade das relações sociais movidas por interesse, o casamento adúltero e infeliz, e a presença de um “heroi” problemático: cheio de fraquezas, manias e incertezas. Há uma análise profunda do psicológico dos personagens e esses, muitas vezes, são reflexos das falhas e hipocrisias do ser humano. A linguagem da prosa realista é culta e objetiva, que caracteriza a intencionalidade do autor em transmitir uma determinada ideia sobre a sua mensagem.
Observe o trecho abaixo, retirado da obra “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, do autor Machado de Assis e perceba os aspectos presentes do realismo:
“…Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos. Meu pai, logo que teve aragem dos onze contos, sobressaltou-se deveras; achou que o caso excedia as raias de um capricho juvenil.
– Desta vez, disse ele, vais para a Europa; vais cursar uma universidade, provavelmente Coimbra; quero-te para homem sério e não para arruador e gatuno. E como eu fizesse um gesto de espanto: — Gatuno, sim, senhor; não é outra cousa um filho que me faz isto…
Sacou da algibeira os meus títulos de dívida, já resgatados por ele, e sacudiu-mos na cara. — Vês, peralta? é assim que um moço deve zelar o nome dos seus? Pensas que eu e meus avós ganhamos o dinheiro em casas de jogo ou a vadiar pelas ruas? Pelintra! Desta vez ou tomas juízo, ou ficas sem cousa nenhuma.”
MACHADO DE ASSIS
Machado de Assis é o principal autor do realismo no Brasil. Entretanto, grandes estudiosos afirmam que Machado não é realista devido às características de sua temática que distorcem essa afirmativa, considerando-o um escritor atemporal. Porém, o vestibular sempre cobra referências do autor à estética realista, devido à localização de tempo em que o autor viveu.
Machado era um narrador autocrítico, que analisava o psicológico dos personagens, fazia uso da ironia para persuadir a reflexão do leitor, inseria toques humorísticos, criticava os valores sociais e a idealização romântica e, além disso, e tinha como especialidade uma linguagem ousada e experimental. É autor de ilustres obras, como “Dom Casmurro”, “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, “Quincas Borba”, “Esaú e Jacó”, “Memorial de Aires”, entre outras.
Para entender a intencionalidade de suas obras, é necessário estar atento à interpretação textual e possuir um senso de análise às palavras do autor, que muitas vezes omitem o que querem expressar, por meio da ironia ou do tom humorístico. Por isso, para conduzi-lo em seus estudos, é importante o acompanhamento de seus textos e uma compreensão mais detalhada sobre suas características.
Assista ao módulo sobre Machado de Assis para conhecer mais sobre o autor!
Exercícios
1. (FGV) Leia o texto abaixo.
“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos. Meu pai, logo que teve aragem dos onze contos, sobressaltou-se deveras; achou que o caso excedia as raias de um capricho juvenil.
– Desta vez, disse ele, vais para a Europa; vais cursar uma universidade, provavelmente Coimbra; quero-te para homem sério e não para arruador e gatuno. E como eu fizesse um gesto de espanto:
– Gatuno, sim senhor. Não é outra coisa um filho que me faz isto…
Sacou da algibeira os meus títulos de dívida, já resgatados por ele, e sacudiu-mos na cara.
– Vês, peralta? É assim que um moço deve zelar o nome dos seus? Pensas que eu e meus avós ganhamos o dinheiro em casas de jogo ou a vadiar pelas ruas? Pelintra! Desta vez ou tomas juízo, ou ficas sem coisa nenhuma.”
(Machado de Assis)
Principalmente a partir da publicação dessa obra, duas características passam a ser reconhecidas no estilo de seu autor. Assinale a alternativa que as contém.
a) Ambiguidade e delicadeza na descrição dos caracteres.
b) Humor escancarado e crítica à família tradicional brasileira.
c) Ironia e análise da condição humana.
d) Crítica ao comportamento do indivíduo como sujeito e não como objeto da sociedade.
e) Análise da alma do indivíduo, desconsiderando a sociedade.
2. (UERJ) Olhos de Ressaca
Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos. Muitos homens choravam também, as mulheres todas. Só Capitu, amparando a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a outra, queria arrancá-la dali. A confusão era geral.
No Meio dela, Capitu olhou alguns instantes para ver o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas lágrimas poucas e caladas. As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as depressa, olhando a furto para a gente que estava na sala. Redobrou as carícias para a amiga, e quis levá-la; mas o cadáver parece que a retinha também. Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem as palavras desta, mas grande e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã.
(ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. Capítulo 123. São Paulo: Martin Claret, 2004)
O personagem-narrador do romance Dom Casmurro encontra-se, no capítulo transcrito, angustiado pela dúvida: o possível adultério de sua esposa, Capitu, com seu melhor amigo, cujo velório ora se narra. O título ― ”Olhos de Ressaca” pode ser justificado pela seguinte passagem:
a) ”Capitu olhou alguns instantes para o cadáver”
b) “olhando a furto para a gente que estava na sala.”
c) “Redobrou de carícias para a amiga, e quis levá-la;”
d) “como se quisesse tragar também o nadador da manhã.”
3. (ENEM) No trecho abaixo, o narrador, ao descrever a personagem, critica sutilmente um outro estilo de época: o romantismo.
“Naquele tempo contava apenas uns quinze ou dezesseis anos; era talvez a mais atrevida criatura da nossa raça, e, com certeza, a mais voluntariosa. Não digo que já lhe coubesse a primazia da beleza, entre as mocinhas do tempo, porque isto não é romance, em que o autor sobredoura a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas; mas também não digo que lhe maculasse o rosto nenhuma sarda ou espinha, não. Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza, cheia daquele feitiço, precário e eterno, que o indivíduo passa a outro indivíduo, para os fins secretos da criação.”
(ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Jackson,1957.)
A frase do texto em que se percebe a crítica do narrador ao romantismo está transcrita na alternativa:
a) … o autor sobredoura a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas …
b) … era talvez a mais atrevida criatura da nossa raça …
c) Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza, cheia daquele feitiço, precário e eterno, …
d) Naquele tempo contava apenas uns quinze ou dezesseis anos …
e) … o indivíduo passa a outro indivíduo, para os fins secretos da criação.
4. (UNIOESTE-PR) “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis […]”.
Neste trecho, de Memórias póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis:
a) surpreende o leitor com um vocabulário exótico e comparações inesperadas.
b) dá seu depoimento autobiográfico e impressionista, através de um estilo rebuscado e colorido.
c) explora com muita felicidade a “psicologia feminina”, razão pela qual foi aceito com entusiasmo pelo público ansioso de uma literatura romântica.
d) focaliza o emergente proletariado fluminense e os interesses ocultos por trás de suas ações aparentemente triviais.
e) dá um exemplo da ironia e do humor característicos de sua obra, frutos de um profundo pessimismo.
5. (UEM-PR) Assinale a alternativa incorreta sobre Machado de Assis.
a) Estilo sóbrio, com descrições moderadas.
b) Linguagem vibrante, cheia de metáforas.
c) Senso de humor sutil e velado.
d) Personalidade um tanto melancólica, pessimista.
e) Enfatiza os aspectos psicológicos das personagens.
GABARITO
1. C
2. D
3. A
4. E
5. B