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No Lindo Mundo da Narração

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Nesse lindíssimo domingo ensolarado, quando você poderia estar esperando aquela onda perfeita na praia, mas na verdade está a caminho da segunda prova da UERJ, aqui estou eu novamente, pra tratar de tema bastante comum nas provas do Enem: o foco narrativo.

Na prova de 2006, algumas questões apresentavam justamente pontos que abordavam as mudanças e implicações de perspectivas do narrador (lembrem daquela questão com o texto do Cornélio Pires), então acho bacana lembrarmos que a narrativa convencional pode apresentar, pelo menos, quatro tipos de narrador. Vamos a eles?

O narrador personagem é aquele que apresenta uma perspectiva em primeira pessoa dos acontecimentos, já que participa em primeira mão dos fatos relatados. Em geral, essa visão da narração costuma ser parcial, visto que as opiniões do narrador ficam bastante evidentes, graças à utilização de classes de palavras que tendem a explicitar uma única interpretação dos fatos (adjetivos e advérbios). Veja esse trecho de Dom Casmurro:

Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos. Muitos homens choravam também, as mulheres todas. Só Capitu, amparando a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a outra, queria arrancá-la dali. A confusão era geral. No Meio dela, Capitu olhou alguns instantes para ver o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas lágrimas poucas e caladas…

O narrador também pode ser um personagem, porém não precisa ser o protagonista, como em Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, onde a narrativa é feita por alguém que parece acompanhar as aventuras do protagonista.

Temos o narrador observador, em terceira pessoa, que não se envolve nos fatos relatados e, dessa forma, parece ser aquele que tem o maior grau de imparcialidade, já que relata apenas o ocorrido, sem maiores envolvimentos com os personagens ou os acontecimentos. Veja esse trecho de um texto de Clarice Lispector, em que prevalece o descritivismo do narrador meramente observador:

O sono do líder é agitado. A mulher sacode-o até acordá-lo do pesadelo. Estremunhado, ele se levanta, bebe um pouco de água, vai ao banheiro onde se vê diante do espelho. O que ele vê? Um homem de meia-idade. Ele alisa os cabelos das têmporas, volta a deitar-se. Adormece e a agitação do mesmo sonho recomeça.

Finalizando, temos o narrador observador onisciente. Onisciência é a consciência a respeito de tudo e de todos. Dessa forma, esse tipo de narrador, além de nos contar os fatos, possui entendimento pleno a respeito das características particulares dos personagens, assim como sua história de vida, segredos, temores, anseios. Pode ainda dar esclarecimentos a respeito do espaço com maior fidelidade, já que é capaz de se aproximar ou distanciar dos fatos narrados. Perceba como fica claro esse procedimento neste trecho de O Cortiço, em que o narrador apresenta características mais subjetivas da personagem narrada, assim como consegue estar em diferentes pontos do cenário ao mesmo tempo:

A Bruxa surgiu à janela da sua casa, como à boca de uma fornalha acesa. Estava horrível; nunca fora tão bruxa. O seu moreno trigueiro, de cabocla velha, reluzia que nem metal em brasa; a sua crina preta, desgrenhada, escorrida e abundante como as das éguas selvagens, dava-lhe um caráter fantástico de fúria saída do inferno. E ela ria-se, ébria de satisfação, sem sentir as queimaduras e as feridas, vitoriosa no meio daquela orgia de fogo, com que ultimamente vivia a sonhar em segredo a sua alma extravagante de maluca. Ia atirar-se cá para fora, quando se ouviu estalar o madeiramento da casa incendiada, que abateu rapidamente, sepultando a louca num montão de brasas.

De forma geral, é isso. Não devemos imaginar que um mesmo texto apresenta o mesmo narrador do início ao fim. Não haveria graça alguma se fosse assim, certo? Portanto, atenção no enfoque e nas características que podem ser implicadas.

Até a próxima, queridos.

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