Quem é Machado de Assis na fila do vestibular? Te mostramos os principais motivos pelos quais você deve estudar um dos maiores escritores do Brasil.
Um dos principais autores da literatura brasileira, fundador da Academia Brasileira de Letras; referência inspiradora para jovens e adultos, jornalista, contista, cronista, romancista, poeta, crítico literário e teatrólogo: esse era Machado de Assis.
O AUTOR
Machado de Assis (1839 – 1908) nasceu no Rio de Janeiro. Era de uma família humildade e pobre, frequentou apenas a escola primária e aprendeu a ler com os recursos que pôde. Era mulato, epilético, gago e conseguiu alcançar uma alta posição social, dentro de uma sociedade escravocrata. Estudiosos afirmam, que dos poucos retratos ainda existentes do autor, houve um processo de “embranquecimento” de sua pele e seus traços, visto que, naquele momento, destacar ou valorizar a figura de um negro rompia com os valores de uma sociedade conservadora.
Entre tantas funcionalidades de Machado, como jornalista, contista, cronista, romancista, poeta, crítico literário, teatrólogo, funcionário público, revisor, tipógrafo…. Ganhou enorme destaque pela sua fantástica produção literária.
Seu caráter crítico, irônico, inovador, humorístico e observador sobre o comportamento humano e a análise do caráter dos personagens, fez com que suas obras ultrapassassem o momento histórico em que ele viveu, visto que introduzia novas técnicas e novas abordagens, principalmente em relação à uma nova faceta da figura feminina, que se desvinculava da ideia de uma visão conservadora e moral. Nesse sentido, muitos estudiosos não o consideram um escritor realista (em muitos trechos de suas obras, percebemos uma crítica ao descritivismo desse movimento literário).
ANÁLISE DE CARACTERÍSTICAS MACHADIANAS
As obras machadianas eram produzidas em prosa e, com a presença de um enredo não-linear, aprofundada em uma análise psicológica dos personagens e, um dos elementos mais significativos, é o posicionamento do narrador. Com caráter persuasivo, o narrador –que por muitas vezes também é personagem- é ativo ao longo do enredo e dialoga o tempo inteiro com o leitor. Além disso, em alguns momentos, interfere no enredo e admite uma posição provocadora sobre seu posicionamento, incitando que o interlocutor também pense da mesma forma.
Outro ponto importante é a tensão entre a psicologia do indivíduo e sua realidade social.
Veja abaixo, alguns exemplos da comunicação estabelecida entre o narrador e seu leitor:
“Cuidado, leitor, vamos entrar na alcova de uma donzela.
A esta notícia o leitor estremece e hesita. É naturalmente um homem de bons costumes, acata as famílias e preza as leis do decoro público e privado.
[…] Volta a folha e passa a coisa melhor.”
(O anjo das donzelas, Machado de Assis)
“Não me tenhas por sacrilégio, leitora minha devota a limpeza da intenção lava o que puder haver menos curial no estilo. Estávamos ali com o céu em nossas mãos, unindo os nervos, faziam das duas criaturas uma só, uma só criatura seráfica.”
(Dom Casmurro, Machado de Assis)
Ademais, quando o narrador explica a construção de sua obra, podemos associar essa produção conduzida pelo próprio narrador como a função metalinguística da linguagem.
Outro ponto interessante a ser abordado, é o da descrição feminina, que está longe da figura idealizada da escola Romântica. Aqui, a mulher é mais concreta, abordada não só por suas qualidades, mas também por seus defeitos. É uma mulher real, sem ser fantasiada pelo narrador.
Observe o trecho abaixo, em que o autor rompe com a idealização romântica, voltada à figura feminina:
“Não digo que já lhe coubesse a primazia da beleza, entre as mocinhas do tempo, porque isto não é romance, em que o autor sobredoura a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas; mas também não digo que lhe maculasse o rosto nenhuma sarda ou espinha, não. Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza, cheia daquele feitiço, precário e eterno, que o indivíduo passa a outro indivíduo, para os fins secretos da criação.”
(Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis)
“Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, desciam-lhe pelas costas. Morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo. As mãos, a despeito de alguns ofícios rudes, eram curadas com amor, não cheiravam a sabões finos nem águas de toucador, mas com água do poço e sabão comum trazia-as sem mácula. Calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos.”
(Dom Casmurro, Machado de Assis)
A ironia machadiana e o ceticismo também são uns dos principais aspectos que fazem referência ao autor. Com um toque humorístico e, por muitas vezes sutil, estes conseguem expressar – com inteligência – as verdadeiras intenções do autor, fazendo abordagens sobre a hipocrisia humana, as relações por interesse, o adultério, a infelicidade no casamento, a ascensão social, o egocentrismo, entre outras.
Veja alguns trechos, em que percebemos seu tom debochado sobre aquilo o que foi dito:
“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis.”
(Memórias Póstumas de Brás Cubas)
“A abolição é a aurora da liberdade; emancipado o preto, resta emancipar o branco.”
(Esaú e Jacó)
“Eu não sou homem que recuse elogios. Amo-os; eles fazem bem à alma e até o corpo. As melhores digestões da minha vida são as dos jantares em que sou brindado”
(A semana)
A obra machadiana é muito complexa e recheada de visões críticas sobre o momento histórico de sua época, inclusive sobre as teorias propagadas sobre o cientificismo do século XIX. Não podemos esquecer, ainda, que a linguagem machadiana é altamente ousada e experimental, por isso, muitos estudiosos afirmam que Machado pode ter sido um dos percursores ao movimento Modernista.
De tantas obras memoráveis, não podemos deixar de citar alguns, como “Dom Casmurro”, “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, “Quincas Borba”, Esaú e Jacó”, “Memorial de Aires”, “Helena” e Ressureição”. Entre seus inúmeros contos, podemos destacar “Missa do Galo”, “O alienista”, “A cartomante”, “Noite de almirante”, “Teoria do Medalhão”, “Verba Testementária” e “O espelho”.
EXERCÍCIOS
1. “Com efeito, um dia de manhã, estando a passear na chácara, pendurou-me uma ideia no trapézio que eu tinha no cérebro. Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a pernear, a fazer as mais arrojadas cabriolas de volatim, que é possível crer. Eu deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a forma de um X: decifra-me ou devoro-te.”
(Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis)
Sobre o texto mostrado, pode-se dizer que:
a) o autor faz uma abordagem superficial da situação.
b) o autor preocupa-se com os detalhes, por meio de minuciosa descrição.
c) o autor dá relevância a outras circunstâncias, negligenciando o foco do assunto.
d) o autor não mostra preocupação com o discernimento do leitor, pois apenas sugere situações.
e) contempla a si próprio, num ritual egocêntrico e narcisista.
2. “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos. Meu pai logo que teve aragem dos quinze contos sobressaltou-se deveras; achou que o caso excedia as raias de um capricho juvenil.
— Dessa vez, disse ele, vais para Europa, vais cursar uma Universidade, provavelmente Coimbra, quero-te homem sério e não arruador e não gatuno.
E como eu fizesse um gesto de espanto:
— Gatuno, sim senhor, não é outra coisa um filho que me faz isso.”
(Machado de Assis – Memórias póstumas de Brás Cubas)
De acordo com essa passagem da obra, pode-se antecipar a visão que Machado de Assis tinha sobre as pessoas e sobre a sociedade. A esse respeito, assinale a alternativa correta.
a) O amor é fruto de interesse e compõe o pilar das instituições hipócritas.
b) O amor, se sincero, supera todas as barreiras, inclusive as financeiras.
c) O caráter autoritarista moldava as relações familiares, principalmente entre pai e filho.
d) Havia medo de que a marginalidade envolvesse os jovens daquela época.
e) O amor era glorificado e apontado como o único caminho para redimir as pessoas.
3. Texto para as questões 3 e 4
“Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto que o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; o segundo é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo.”
“Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis)
Essa é a abertura do famoso romance de Machado de Assis. Dentro desse contexto, já dá para se ver o tipo de narrativa que será explorada. Assinale a alternativa correta a esse respeito.
a) A narrativa decorre de forma cronologicamente correta, de acordo com a passagem do tempo: infância, juventude, maturidade e velhice.
b) A linearidade das ações apresenta cenas de suspense, dado o comportamento inusitado dos personagens.
c) Não há como prever o final da narrativa, já que seu enredo é, propositadamente, complicado.
d) A ação terá, como cenário, os diversos centros cosmopolitas do mundo.
e) O autor usa o recurso do flashback devido a sua intenção de iniciar o romance pelo “fim”.
4. Em relação à questão anterior, infere-se que a linguagem dispõe de um recurso enriquecedor: a disposição das palavras no espaço frasal. Sendo assim, que tipo de leitura pode-se fazer dessas duas expressões: “autor defunto” e “defunto autor”?
a) A colocação da palavra defunto após a palavra autor leva-nos a pensar que o segundo elemento está em fase final de carreira.
b) Defunto autor remete à ideia de que a pessoa irá escrever suas memórias dentro de um cemitério.
c) Ambas as expressões transmitem a mesma ideia, com iguais valores semânticos.
d) A expressão defunto autor aparece de forma metaforizada, original, privilegiando uma nova forma de narração autobiográfica.
e) Ambas as construções não têm expressão na obra biográfica de Machado de Assis.
5. A propósito de Dom Casmurro, de Machado de Assis, é correto afirmar:
a) A narrativa de Bento Santiago é comparável a uma acusação: aproveitando sua formação jurídica, o narrador pretende configurar a culpa de Capitu.
b) O artifício narrativo usado é a forma de diário, de modo que o leitor receba as informações do narrador à medida que elas acontecem, mantendo-se assim a tensão.
c) Elegendo a temática do adultério, o autor resgata o romantismo de seus primeiros romances, com personagens idealizadas entregues à paixão amorosa.
d) O espaço geográfico e social representado é situado em uma província do Império, buscando demonstrar que as mazelas sociais não são prerrogativa da Corte.
e) Bentinho desejava a morte de Escobar (até tentou envenená-lo uma vez), a ponto de se sentir culpado quando o ex amigo morreu afogado.
GABARITO
1. C
2. A
3. E
4. D
5. A