Com a propagação dos valores renascentistas a partir do século XVI, o homem afastou-se dos preceitos religiosos e o pensamento antropocentrista ganhou destaque no âmbito social. Com a chegada do século XVII, o movimento da Contrarreforma invade a Europa, deixando o homem europeu dividido entre o retorno da influência cristã e a visão antropocêntrica. Nesse período caracterizado pela dualidade de pensamento, surge um movimento artístico, denominado como Barroco.
O CONTEXTO HISTÓRICO
Para entendermos o movimento artístico Barroco, é preciso compreender o contexto histórico em que o mesmo surgiu. No século XVII, a sociedade estava dividida em três classes: o clero, a nobreza e o Terceiro Estado, esse formado por camponeses, artesãos e pela burguesia. No entanto, essa divisão estrutural não possibilitava uma ascensão social – embora houvessem casos particulares de mobilidade – o predomínio prevalecia aos ideais aristocráticos.
Nessa totalidade, as reformas protestantes, iniciadas no século anterior, ganhavam mais adeptos ao longo do tempo. Essas reformas lutavam pelo rompimento da superioridade cristã, aos abusos de corrupção, venda de perdão aos fiéis e compra de cargos eclesiásticos. Além disso, também defendia a particularidade de cada religião protestante. Com isso, entendemos que a caracterização dessa sociedade estamental propunha a imposição do poder religioso, inclusive sobre o âmbito político e econômico.
Junto a isso, o Renascimento trazia ao ambiente europeu um novo conceito artístico e cultural, além de estabelecer o pensamento antropocêntrico. Em contradição a esse pensamento, a Igreja busca reforçar sua influência e recuperar seus fiéis, por meio da Contrarreforma. Nesse cenário, a expressão artística barroca surge com base na dualidade de pensamentos: o conflito das visões antropocêntricas e teocêntricas.
Características do Barroco
A partir de sua contextualização histórica, é possível compreender de que modo a temática barroca é elaborada. Em relação ao conteúdo, pode-se destacar as seguintes características.
- Oposição entre mundo material e mundo espiritual;
- Conflito entre visão antropocêntrica e teocêntrica;
- Contraste entre fé e razão
- Sentimento do eu lírico de morbidez;
- Idealização amorosa; sensualismo e sentimento de culpa cristão;
- Consciência da efemeridade do tempo;
- Presença do sentimento cristão.
Além dos aspectos presentes na temática, também temos as características da estrutura formal barroca. Veja:
a) Presença de figuras de linguagem, como antítese, paradoxo e hipérbato;
b) Linguagem mais rebuscada;
c) Gosto pela forma clássica, o soneto;
d) Gosto por construções complexas e raras.
Além disso, existem duas tendências muito presentes na literatura barroco. Uma delas é conhecida como cultismo, ou seja, caracterizado pelo jogo de palavras, a exploração de efeitos sensoriais e a presença de um vocabulário mais sofisticado. Já o conceptismo é caracterizado pelo jogo de ideias, constituído por sutilezas do raciocínio e do pensamento lógico.
Agora, observe abaixo o trecho do poema A Jesus Cristo Nosso Senhor, de Gregório de Matos, que aborda a estética barroca, em que conseguimos identificar algumas características apontadas em nosso estudo:
“Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque, quanto mais tenho delinquido,
Vós tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado. […]”
Perceba que o eu lírico sente-se culpado pelo desvio ao mundo espiritual, estabelecendo uma relação de submissão à conduta religiosa, por ter se afastado em algum momento de seus princípios cristãos.
O Barroco no Brasil
No século XVII, em terras brasileiras, o Brasil ainda era uma colônia. A grande movimentação econômica da época, era a exploração da cana-de-açúcar. Além disso, também havia a escravização ao negro, que trabalhava e servia aos senhores de engenho.
A estética barroca no Brasil dividiu-se em: prosa e poesia. Na prosa, os principais autores são Padre Antônio Vieira, Sebastião da Rocha Pita e Nuno Marques Pereira. Já no campo da poesia, podemos destacar Gregório de Matos (principal escritor do barroco), Bento Teixeira, Botelho de Oliveira e Frei Itaparica.
Padre Antônio Vieira foi um grande escritor, sua obra, além de conter pregações de intuito religioso, também abordava causas políticas e possuía um valor mais crítico sobre a realidade social: abordada desde os colonos que escravizavam até companheiros da mesma profissão religião. Com isso, causou o ressentimento em muitas pessoas. Suas pregações abordavam sobre a posição do índio, do domínio inglês sobre a colônia por ocasião da invasão holandesa e também sobre a educação espiritual. Além disso, também era orador e possui uma vasta obra entre sermões e cartas.
Já Gregório de Matos, principal escritor da estética barroca, ficou reconhecido por seu caráter ousado e crítico, ao expor valores morais e principalmente, pela sua capacidade de produção satírica, em que ficou conhecido como “Boca do Inferno”, por criticar diferentes grupos sociais.
Além disso, Gregório de Matos cultivou três vertentes da poesia lírica: a amorosa, marcada pelo dualismo entre amor espiritual e carnal; a religiosa, mostrando sua submissão aos preceitos cristãos e; a filosófica, com apelo mais reflexivo e que aborda também a consciência da efemeridade do tempo.
Na literatura satírica, utilizava uma linguagem com palavras de baixo escalão, e exercia fortes críticas a todas as classes da sociedade baiana de seu tempo. Desde os dirigentes políticos, até os escravos da realidade do Brasil Colônia.
Observe o trecho abaixo, de uma lírica satírica do autor, em que esse critica o poder político de sua época:
“Que falta nesta cidade? …….Verdade
Que mais por sua desonra ….. Honra
Falta mais que se lhe ponha …. Vergonha.
O demo a viver se exponha,
por mais que a fama a exalta,
numa cidade, onde falta
Verdade, Honra, Vergonha.
[…]”
Exercícios
1. (UNICAMP)A arte colonial mineira seguia as proposições do Concílio de Trento (1545-1553), dando visibilidade ao catolicismo reformado. O artífice deveria representar passagens sacras. Não era, portanto, plenamente livre na definição dos traços e temas das obras. Sua função era criar, segundo os padrões da Igreja, as peças encomendadas pelas confrarias, grandes mecenas das artes em Minas Gerais.
(Adaptado de Camila F. G. Santiago, “Traços europeus, cores mineiras: três pinturas coloniais inspiradas em uma gravura de Joaquim Carneiro da Silva”, em Junia Furtado (org.), Sons, formas, cores e movimentos na modernidade atlântica. Europa, Américas e África. São Paulo: Annablume, 2008, p. 385.)
Considerando as informações do enunciado, a arte colonial mineira pode ser definida como:
a) renascentista, pois criava na colônia uma arte sacra própria do catolicismo reformado, resgatando os ideais clássicos, segundo os padrões do Concílio de Trento.
b) barroca, já que seguia os preceitos da Contrarreforma. Era financiada e encomendada pelas confrarias e criada pelos artífices locais.
c) escolástica, porque seguia as proposições do Concílio de Trento. Os artífices locais, financiados pela Igreja, apenas reproduziam as obras de arte sacra europeias.
d) popular, por ser criada por artífices locais, que incluíam escravos, libertos, mulatos e brancos pobres que se colocavam sob a proteção das confrarias.
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2. (ENEM)
(BARDI, P. M. Em torno da escultura no Brasil. São Paulo: Banco Sudameris Brasil, 1989.)
Com contornos assimétricos, riqueza de detalhes nas vestes e nas feições, a escultura barroca no Brasil tem forte influência do rococó europeu e está representada aqui por um dos profetas do pátio do Santuário do Bom Jesus de Matosinho, em Congonhas (MG), esculpido em pedra-sabão por Aleijadinho. Profundamente religiosa, sua obra revela:
a) liberdade, representando a vida de mineiros à procura da salvação.
b) credibilidade, atendendo a encomendas dos nobres de Minas Gerais.
c) simplicidade, demonstrando compromisso com a contemplação do divino.
d) personalidade, modelando uma imagem sacra com feições populares.
e) singularidade, esculpindo personalidades do reinado nas obras divinas.
3. Leia com atenção o poema a seguir e marque a opção correta.
À INSTABILIDADE DAS COUSAS DO MUNDO
Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.
Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?
Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.
Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.
(Gregório de Matos Guerra)
Sobre o tema central do soneto acima é correto dizer:
a) o eu-lírico aborda a superficialidade sobre as aparências.
b) há uma visão dicotômica entre a grandeza divina e a pequenez do homem.
c) há a preocupação com a efemeridade da vida.
d) o eu-lírico expõe sobre o sofrimento amoroso em função do sentimento de culpa.
e) o eu lírico expõe a dualidade dos sentimentos do homem barroco.
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4. (FEI)
“Em tristes sombras morre a formosura,
em contínuas tristezas a alegria”
Nos versos citados acima, Gregório de Matos empregou uma figura de linguagem que consiste em aproximar termos de significados opostos, como “tristezas” e “alegria”. O nome desta figura de linguagem é:
a) metáfora
b) aliteração
c) eufemismo
d) antítese
e) sinédoque
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GABARITO
1. B
2. D
3. C
4. D