Contexto Histórico do Pré-Modernismo
O período de transição
Euclides da Cunha
Monteiro Lobato
Lima Barreto
Augusto dos Anjos
O pré-modernismo
O pré-modernismo pode ser considerado um período de transição entre os movimentos literários situados ao final do século XIX e início do século XX. Tal fato ocorre porque muitos autores daquele período passaram, aos poucos, a se aproximarem de uma inovação temática, formal e linguística (características essas que só se consolidarão na 1ª fase do Modernismo). No entanto, ao mesmo tempo, os autores ainda se sentiam presos a valores conservadores que marcaram o século XIX (como exemplo, a valorização da linguagem culta), por isso, a noção de transição. É muito importante observar como as obras pré-modernista começaram a inserir, nos textos em prosa, uma preocupação com a identidade nacional.
Imagem da Guerra de Canudos. Disponível em: http://www.grupoescolar.com/a/b/915D6.jpg
Contexto histórico
O contexto histórico liga-se diretamente à produção literária, pois os ideais daquela época contribuíram para a criação de textos com maior engajamento social. Além disso, tal período de transição começou próximo ao início do século XX e terminou em 1922, ano da Semana de Arte Moderna. Entre os acontecimentos históricos que motivaram uma maior preocupação social no âmbito literário, podemos destacar: A Revolta de Canudos (1896-97), A Revolta da Vacina (1904), a Greve dos Operários (1917) e o período da República Café Com Leite (1894- 1930).
Características do pré-modernismo
Conheça os principais aspectos que marcaram o pré-modernismo:
- Preocupação e denúncia social;
- Uso de dialetos regionais nas prosas;
- Linguagem coloquial;
- Foco na classe marginalizada;
- Foco na região Nordeste;
- Sincretismo literário;
- Romances com engajamento sociopolíticos;
- Interesse na realidade brasileira;
- Tendências deterministas (provindas do movimento Realista-Naturalista)
Além disso, não podemos esquecer dos autores que mais se destacaram neste momento: na prosa, temos João do Rio, Euclides da Cunha, Lima Barreto, Graça Aranha e Monteiro Lobato. Já no âmbito da poesia, o autor Augusto dos Anjos se destaca por sua temática de cunho “orgânico”, fazendo alusão a micróbios, decomposição orgânica e seu tom de intensa melancolia e pessimismo
Textos de apoio
TEXTO I
[...] A entrada dos prisioneiros foi comovedora. [...]
Os combatentes contemplavam-nos entristecidos. Surpreendiam-se, comoviam-se. O arraial, in extremis, punha-lhes adiante, naquele armistício, uma legião desarmada, mutilada, faminta e claudicante, num assalto mais duro que os das trincheiras em fogo. Custava-lhes admitir que toda aquela gente inútil e frágil saísse tão numerosa ainda dos casebres bombardeados durante três meses. Contemplando-lhes os rostos baços, os arcabouços esmirrados e sujos, cujos molambos em tiras não encobriam lanhos, escaras e escalavros – a vitória tão longamente apetecida decaía de súbito. Repugnava aquele triunfo. Envergonhava. Era, com efeito, contraproducente compensação a tão luxuosos gastos de combates, de reveses e de milhares de vidas, o apresamento daquela caqueirada humana – [...], entre trágica e imunda, passando-lhes pelos olhos, num longo enxurro de carcaças e molambos...
Nem um rosto viril, nem um braço capaz de suspender uma arma, nem um peito resfolegante de campeador domado: mulheres, sem-número de mulheres, velhas espectrais, moças envelhecidas, velhas e moças indistintas na mesma fealdade, escaveiradas e sujas, filhos escanchados nos quadris desnalgados, filhos encarapitados às costas, filhos suspensos aos peitos murchos, filhos arrastados pelos braços, passando; crianças, sem-número de crianças; velhos, sem-número de velhos; raros homens, enfermos opilados, faces túmidas e mortas, de cera, bustos dobrados, andar cambaleante. [...]
[...] Uma megera assustadora, bruxa rebarbativa e magra [...] rompia, em andar sacudido, pelos grupos miserandos, atraindo a atenção geral. Tinha nos braços finos uma menina, neta, bisneta, tataraneta talvez. E essa criança horrorizava. A sua face esquerda fora arrancada, havia tempos, por um estilhaço de granada; de sorte que os ossos dos maxilares se destacavam alvíssimos, entre bordos vermelhos da ferida já cicatrizada… A face direita sorria. E era apavorante aquele riso incompleto e dolorosíssimo aformoseando uma face extinguindo-se repentinamente na outra [...].
Aquela velha carregava a criação mais monstruosa da campanha. Lá se foi com seu andar agitante, [...] seguindo a extensa fila de infelizes… [...]
CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de Canudos. Edição Especial. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1980.
Texto II
Enfim, arrasada a cidadela maldita! Enfim, dominado o antro negro, cavado no centro de adusto sertão, onde o Profeta das longas barbas sujas concentrava a sua força diabólica, feita de fé e patifaria, alimentada pela superstição e pela rapinagem.
BILAC, Olavo. Cidadela maldita. In: Vossa insolência: crônicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
Texto III
[...] a verdade nua manda dizer que entre as raças de variado matiz, formadoras da nacionalidade e metidas entre o estrangeiro recente e o aborígene de tabuinha no beiço, uma existe a vegetar de cócoras, incapaz de evolução, impenetrável ao progresso. Feia e sorna [preguiçosa], nada a põe de pé. [...]Jeca Tatu é um piraquara [caipira] do Paraíba, maravilhoso epítome [resumo] de carne onde se resumem todas as características da espécie. De pé ou sentado as idéias se lhe entramam, a língua emperra e não há de dizer coisa com coisa.
De noite, na choça de palha, acocora-se em frente ao fogo para "aquentá-lo", imitado da mulher e da prole.
Para comer, negociar uma barganha, ingerir um café, tostar um cabo de foice, fazê-lo noutra posição será desastre infalível. Há de ser de cócoras. [...]
[...]
Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade!
Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca filósofo...
Seu grande cuidado é espremer todas as consequências da lei do menor esforço - e nisto vai longe. [...]
Um terreirinho descalvado rodeia a casa. O mato o beira. Nem árvores frutíferas, nem horta, nem flores - nada revelador de permanência. Há mil razões para isso; porque não é sua a terral porque se o "tocarem" não ficará nada que a outrem aproveite; porque para frutas há o mato; porque a "criação" come; porque… [...]
"Não paga a pena".Todo o inconsciente filosofar do caboclo grulha nessa palavra atravessada de fatalismo e modorra. Nada paga a pena. Nem culturas, nem comodidades. De qualquer jeito se vive.
LOBATO, Monteiro. Urupês. 37 ed. São Paulo: Brasiliense, 2004.
Texto IV
Versos íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de sua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Augusto dos Anjos
Texto V
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.
A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações atléticas. É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gingante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados. Agrava-o a postura normalmente abatida, num manifestar de displicência um caráter de humildade deprimente. A pé, quando parado, recosta-se invariavelmente ao primeiro umbral ou parede que encontra; a cavalo, se sofreia o animal para trocar duas palavras com um conhecido, cai logo sobre um dos estribos, descansando sobre a espenda da sela. Caminhando, mesmo a passo rápido, não traça trajetória retilínea e firme. Avança celeremente, num bambolear característico, de que parecem ser o traço geométrico os meandros das trilhas sertanejas. (…)
É o homem permanentemente fatigado.”
CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de Canudos. Edição Especial. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1980.