Questão 19 da prova azul do primeiro dia do Enem 2024

Até ali que sabia das misérias do mundo? Nada. Aquela noite do Castelo, tão simples, tão monótona, fora uma revelação! Era bem certo que a lágrima existia, que irrompiam soluços de peitos oprimidos, que para alguém os dias não tinham cor nem a noite tinha estrelas! Ela, criada entre beijos, no aroma dos seus jardins, com as vontades satisfeitas, o leito fofo, a mesa delicada, sentira sempre no coração um desejo sem nome, um desejo ou uma sa udade absurda, a saudade do céu, como dizia dr. Gervásio, e que não era mais que a doida aspiração da artista incipiente, que germinava no seu peito fraco.

E aquela mesma mágoa parecia-lhe agora doce e embaladora, comparando-se à outra, a Sancha, da sua idade, negra, feia, suja, levada a pontapés, dormindo
sem lençóis em uma esteira, comendo em pé, apressada, os restos parcos e frios de duas velhas, vestida de algodões rotos, curvada para um trabalho sem descanso nem paga!

Por quê? Que direito teriam uns a todas as primícias e regalos da vida, se havia outros que nem por uma nesga viam a felicidade?

ALMEIDA, J. L. A falência. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 28 dez. 2023.

Nesse fragmento do romance de Júlia Lopes de Almeida, escrito no cenário brasileiro pós-abolição, a narradora exprime um olhar crítico sobre a

  1. desvalorização da arte produzida por mulheres.
  2. mudança das condições de moradia do povo negro.
  3. ruptura do projeto político de emancipação feminina.
  4. exploração da força de trabalho da população negra.
  5. disputa de poder entre brancos e negros no século XIX.

Gabarito da questão

Opção D

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44 07 32

Comentário da questão

No fragmento, a narradora descreve uma personagem criada em uma vida de conforto e privilégio, que, ao comparar sua situação com a de Sancha — uma jovem negra que vive em condições de extrema miséria e exploração —, se depara com a desigualdade social e racial existente no Brasil pós-abolição. Sancha é retratada como alguém que enfrenta uma vida de trabalho árduo, sem descanso ou direitos, sendo tratada de forma desumana.

Esse contraste evidencia a crítica da autora à exploração da força de trabalho da população negra, que, mesmo após a abolição da escravidão, continuava a sofrer opressão e marginalização, sem acesso às mesmas oportunidades ou qualidade de vida que as pessoas brancas. Portanto, a alternativa que melhor representa essa crítica é a d).

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