O trabalho e a história
Trabalho humano X Trabalho animal
O fordismo
O taylorismo
O toyotismo
O trabalho e a socialização
O que é trabalho?
O trabalho é a atividade humana que necessita do uso de capacidades físicas e mentais, além do dispêndio de energia, realizada pelo ser humano para suprir diversas necessidades. Ao trabalharmos realizamos uma transformação no mundo ao nosso redor, produzindo e criando algo novo.
O trabalho como atividade humana se caracteriza pela consciência da realização deste. O que difere uma abelha, uma aranha ou um joão-de-barro de um engenheiro ou arquiteto? Exatamente o projeto contemplado na imaginação do humano antes da realização do trabalho em si. Assim, mesmo toda perfeição simétrica da abelha não contém o projeto idealizado pelo arquiteto. Não basta seguir os instintos (como a abelha), o humano precisa hierarquizar e subordinar sua vontade, concentrar-se no fim almejado e racionalizar o processo de transformação. A partir da consciência e da subordinação surge o reconhecimento. O trabalhador, ao fim do processo, se enxerga no produto do seu trabalho, produto esse que se torna parte do seu realizador.
No liberalismo clássico os autores apontavam o trabalho como a atividade que agrega valor. Locke, por exemplo, afirma que a propriedade privada é um direito natural e que, para identificar o que é de propriedade de alguém é necessário se atentar ao trabalho. Ou seja, aquilo que foi alvo da ação humana e foi melhorado ou aperfeiçoado por isso é a propriedade privada de do indivíduo que trabalhou nessa coisa. Já Adam Smith determina que a riqueza das nações não está centrada na sua capacidade de acumular ouro, que é apenas um produto dentre vários, mas sim na capacidade de produzir bens, ou seja, na capacidade das nações de agregar valor pelo trabalho.
O trabalho para os Clássicos da Sociologia
Émile Durkheim
Para Durkheim o trabalho tinha uma importância para além da esfera econômica. Ele acreditava que toda sociedade se formava em torno de um determinado grau de consenso. Ou seja, os indivíduos daquele grupo compartilhavam, em algum nível, uma crença que mantinha a sociedade unida. Essa união recebeu o nome de coesão social e essa coesão vem da solidariedade, um senso moral gerado pelo trabalho em comunidade.
De acordo com Durkheim, nas sociedades anteriores ao capitalismo, a divisão social do trabalho era pequena. Isto ocasionava poucas diferenças entre os indivíduos e fazia da sociedade algo mais homogêneo. Assim, a coesão social era garantida através do compartilhamento de uma mesma visão de mundo, de um mesmo conjunto de ideias e valores dominantes. Este modelo é chamado por Durkheim de solidariedade mecânica.
Nas sociedades modernas, por sua vez, o capitalismo promoveu uma enorme acentuação na divisão social do trabalho. Isso exacerbou a especialização profissional e, portanto, a individualidade. Por isso, a sociedade moderna é heterogênea, contando com grande diversidade de religiões e de visões de mundo no interior de um mesmo contexto social. Na Modernidade, o que une e congrega a sociedade não é o fato das pessoas partilharem uma mesma visão de mundo, mas sim o fato de elas serem mais interdependentes no mundo do trabalho. A consequência disso é que a sociedade capitalista não precisa do compartilhamento de uma mesma visão de mundo para que os indivíduos vivam coesos nela: o que os une são os laços de interdependência econômica. A crença passa a ser então num código complexo e racional de regras de conduta que formam normas jurídicas estipuladas para os indivíduos em relações interdependentes, o direito. É o que Durkheim chamava de solidariedade orgânica.
Karl Marx
Marx afirma que a a relações de trabalho expressam a sociedade e a sua posição nessas relações determinarão sua classe. Essa relação é exploratória e contraditória, pois os controladores da riqueza (burgueses) não são os que a produzem, enquanto aqueles que trabalham não tem acesso à riqueza (proletários). Essa contradição expressa a luta de classes que é o conflito por melhores condições de vida por parte dos trabalhadores e por mais lucro por parte do capitalistas. Essa divisão do trabalho também produz uma estratificação social, já que separa a sociedade em dois grandes grupos. Apesar de assumir a existência de outras classes sociais, como pequenos produtores rurais e comerciários, Marx centra sua análise na burguesia e no proletariado por entender que a principal tensão (que pode produzir uma transformação social) ocorre entre as duas.
Os burgueses exploram os proletários através da mais-valia. Ela representa o excedente de valor da exploração do trabalho. A mais-valia se dá por um desencontro entre o valor pago pelo burguês ao proletário para a produção de mercadorias e o valor que essas mercadorias alcançam no mercado. Ou seja, quando usa a força de trabalho comprada do proletariado, a burguesia gera mais valor (já que o trabalho agrega valor à mercadoria) que necessita remunerar por esse trabalho. Quando termina uma jornada de oito horas uma fábrica, um trabalhador produziu muita riqueza, que fica para o patrão em forma de mercadoria, já que ele é o proprietário dos meios de produção.
No modo de produção capitalista, não são as pessoas o objetivo da produção. Isso possibilita uma gestão fragmentada e eficiente do trabalho, ignorando as consequências sociais do afastamento entre trabalhador e produto. Como consequência, a própria organização da sociedade se fragmenta, o saber, as atividades econômicas, as profissões, as artes etc. Assim o trabalhador não consegue mais conceber o processo produtivo na sua totalidade, perde a noção de como esse processo se dá e de sua posição nele, pendendo noção das consequências jurídico-políticas e ideológicas desse processo também. O trabalhador é afastado também do consumo, não podendo desfrutar da riqueza que é consequência de sua atividade. O trabalho passa a ser tornar não mais a realização do ser humano como ser humano, aquilo que o diferencia dos outros seres, mas uma atividade desprazerosa. Assim ocorre a alienação do trabalho.
Max Weber
Sobre a profissionalização e a especialização no mundo moderno, Weber apresenta uma análise sobre duas atividades das quais foi muito íntimo: cientista e político. Além de um notável pesquisador e professor, Weber atuou como consultor do Estado na redação da constituição de Weimar.
A profissão tem origem na noção de vocação luterana, que afirma que todos temos uma missão dada por Deus. Como o trabalho e o sucesso econômico ganham grande relevância no protestantismo, estes se confundem com a noção de vocação. Assim, não se dedicar a uma profissão, ou uma atividade útil, torna-se uma afronta a Deus. Quando a profissão encontra a vocação, a relação entre as duas constitui contradições. Como observado por Weber, tanto a política como a ciência encontra problemas na remuneração de seus profissionais. Para ele é contraditório que um indivíduo dependa da remuneração que recebe de sua atividade política, já que isso condicionaria sua atuação na disputa pelo poder e prejudicaria seu julgamento frente a problemas de âmbito político. Já o cientista estaria condicionado a uma lógica produtivista, comumente obrigado a ocupar as funções de pesquisador e professor (o que é virtualmente impossível para o autor) abrindo espaço para pessoas não capacitadas e indivíduos se dedicando a atividades para as quais não são vocacionados. Além do que, um cientista remunerado estará submetido ao direcionamento de sua remuneração e não à sua intuição, curiosidade e criatividade cientificas.
Trabalho na história
O trabalho está presente no cotidiano dos seres humanos desde a Pré-História. Em cada período, o sistema de produção baseou-se em características específicas, relacionadas, entre outras coisas, ao contexto histórico em que se encontrava.
Trabalho Primitivo
Costumamos chamar de trabalho primitivo a primeira atividade humana reconhecida com as características acima. No Paleolítico, ou Idade da Pedra Lascada, comunidades humanas se organizavam para construir ferramentas – notadamente o machado – e instrumentos para caçar, para confeccionar suas próprias vestimentas e para preparar os alimentos.
Características da sociedade desse trabalho
Trabalho na Antiguidade
O trabalho predominante na Antiguidade foi o do regime de escravidão onde, majoritariamente, prisioneiros de guerra perdiam sua condição de liberdade e eram obrigados a realizar atividades de produção não remuneradas, já que esse tipo de atividade era considerado depreciativa. Aristóteles, por exemplo, afirmava que é impossível para um homem ser livre e, ao mesmo tempo, ter que ganhar seu próprio pão. Porém, não havia um alto grau de comércio de escravizados, como ocorrido séculos mais tarde.
Características da sociedade desse trabalho
Trabalho na Idade Média
A Idade Média vê cair no desuso o regime de escravidão, mas ainda mantém a noção depreciativa da realização de atividades produtivas. Nesse momento surge o regime de servidão. Nele camponeses trabalhavam em troca de moradia (com acesso à meios de produção, como a terra) e proteção. Os nobres se dedicavam à função de defender os reinos de invasores.
Características da sociedade desse trabalho
Trabalho na Idade Moderna e Contemporânea
No fim do Medievo gradualmente a atividade comercial se intensifica, fazendo surgir uma nova classe, a burguesia. Ocorrem as expansões marítimas e os europeus imprimem o regime de trabalho de escravizados. Sequestrados, os africanos eram submetidos a trabalhos pesados, além de castigos e punições.
Pessoas eram tratadas como coisas, negociadas em larga escala num sistema desumano. Não recebiam nada em troca pelo seu trabalho e eram expostas a condições de vida degradantes. A grande riqueza produzida nas colônias impulsiona a economia europeia, principalmente a inglesa, que vê surgir o fenômeno da máquina a vapor. Esse fenômeno conduz à Revolução Industrial que produz um novo regime de trabalho, o assalariado.
Inicialmente restrito à Europa (nas colônias o regime de trabalho escravo se mantinha), o regime de trabalho assalariado, típico do sistema capitalista, ocorre no rastro da industrialização. Demandando cada vez mais mão- de-obra e com o processo de expulsão dos camponeses das terras de seus senhores, a cidade explode demograficamente alterando radicalmente a dinâmica social.
Um trabalhador, agora conhecido como proletário, nessa época, chegava a trabalhar até dezoito horas por dia. Muitas fábricas e minas de carvão preferiam contratar mulheres e crianças para poder pagar um valor menor de salário. Ainda hoje, o trabalho assalariado está presente em várias sociedades humanas.
Modelos de organização
Fordismo (início do século XX)
O engenheiro norte-americano Frederick W. Taylor (1856-1915), visando a aumentar a eficiência produtiva, estudou tempos e movimentos de operários e máquinas na linha de produção. Seus estudos ficaram conhecidos como Taylorismo.
Henry Ford (1863-1947)já desenvolvia sua linha de montagem para aumentar sua produção, quando ouviu falar das ideias de Taylor. Impressionado, Ford contratou o engenheiro para trabalhar na sua fábrica. O Fordismo nasce dessa associação entre as ideias de Taylor e a prática de Ford. Por isso, o Fordismo também é chamado de Fordismo-Taylorismo. São características do Fordismo:
Linha de montagem: É a famosa esteira de produção retratada no filme Tempos Modernos.
Trabalho especializado (repetitivo): É a pura aplicação das ideias de Taylor. Quanto menor fosse a tarefa executada pelo trabalhador, mais eficiente ele poderia ser. Com o tempo, a tendência era se tornar um especialista naquela tarefa.
Padronização: A repetição das tarefas exigia uma padronização da produção.
Mão de obra alienada: O trabalhador executava apenas uma tarefa e não conhecia todo o método de produção, apenas a sua função.
Produção concentrada: Espacialmente, a fábrica fordista era concentrada em um local, produzindo e armazenando (estoques lotados) tudo no mesmo espaço. A concentração espacial reunia no mesmo espaço milhares de trabalhadores, o que facilitava a ação de sindicatos, por isso, a pressão sindical era muito forte.
Toyotismo (final do século XX)
O modelo de produção toyotista foi idealizado por Eiji Toyoda e Taiichi Ohno e difundido pelo mundo a partir de 1970. O Toyotismo, também conhecido como sistema flexível ou pós-fordista, foi desenvolvido em uma fábrica de automóveis da Toyota, no Japão, buscando atender às especificidades da produção e do território japonês. Todavia, suas características despontaram como alternativa ao Fordismo, que enfrentava sua crise na década de 1970. São características do Toyotismo:
Produtos pouco duráveis: A durabilidade foi um problema para o Fordismo. Nesse sentido, a lógica do Ciclo de Obsolescência Programada, em que os produtos possuem uma data de “validade”, foi fundamental para superar as limitações do consumo fordista.
Diversificação: A produção diversificada, com muitas opções, buscando atender às características de cada mercado, foi importantíssima para oferecer uma maior variedade de produtos.
Just in time: Seguindo a lógica acima, produzir de acordo com a demanda e gosto do mercado permitiu reduzir os estoques e a possibilidade de perdas produtivas.
Mão de obra qualificada: Outra característica que possibilitava o amplo desenvolvimento desse modelo. Com uma mão de obra altamente educada e qualificada, toda melhoria no processo produtivo poderia ser mais rapidamente incorporada, ao mesmo tempo que esses trabalhadores contribuíam para esse progresso.