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Dois tratados sobre o governo

Aula sobre os dois tradados sobre o governo.

Estado de natureza

Contrato social

Sociedade civil

Diferença entre monarquias

O contratualismo de Locke

Como sabemos, Locke foi um filósofo que se dedicou a áreas distintas do pensamento. Além de colaborar com a Teoria do conhecimento pelo empirismo, Locke é um dos mais famosos filósofos políticos da história. Seu pensamento se dedicou a pensar os motivos pelos quais as pessoas formam o Estado e porque esse deve se manter ativo.

Tal como Thomas Hobbes, John Locke também acreditava que a única maneira efetivamente razoável de justificar a existência do poder político seria através da metodologia contratualista. No entanto, diferente de seu predecessor, Locke não tinha uma visão tão pessimista da natureza humana. Esta divergência básica, por sua vez, levou a outras maiores e mais relevantes, fazendo com que Locke defendesse um ideal de governo diretamente oposto àquele que Hobbes defendeu: enquanto o segundo foi um célebre advogado do absolutismo monárquico, Locke é considerado o pai do liberalismo político, uma concepção que vê na garantia da liberdade o papel central do governo.


Estado de natureza em Locke

Antes de tudo, Locke discordava radicalmente da ideia de que o homem é basicamente um ser egoísta. De fato, ele não negava que somos autointeressados e buscamos a satisfação de nossos desejos, porém afirmava também que todos nós temos certo senso moral, certas noções elementares de certo e errado que nos impedem de agir de modo totalmente impulsivo. O ser humano concebido por Locke ainda no estado de natureza é um ser racional, livre e igual, mas não naturalmente bom.

Com efeito, segundo Locke, o estado de natureza é um estado sem lei política, mas não é um estado absolutamente sem lei: vigora nele a lei moral racional, chamada por ele de lei da natureza, a qual nos indica o que é certo e errado independentemente da lei estabelecida pelo Estado. Com efeito, já no estado de natureza, os homens são capazes de perceber pela razão que são iguais e que, portanto, devem tratar-se de modo igualitário: é a igualdade essencial de todos os homens que exige um respeito igual de uns para com os outros. Por sua vez, também segundo Locke, da lei natural se derivam direitos naturais, isto é, certos bens básicos que todo ser humano merece ter reconhecidos. Tais direitos (embrião da ideia futura de direitos humanos), segundo Locke, são três: o direito à vida, à liberdade e à propriedade privada. Sua decorrência da lei natural seria nítida: se todos os homens são iguais, um não tem direito a tomar a vida do outro; se todos os homens são iguais, um não tem direito a se impor sobre a liberdade do outro; se todos os homens são iguais, ninguém tem direito a tomar para si aquilo que o outro adquiriu com seu trabalho. Vê-se assim que o trabalho seria o fundamento do direito à propriedade privada e que todos os três direitos se reduzem à defesa da liberdade do indivíduo frente aos demais. Locke vê o mundo natural como uma propriedade comum, ao passo que a propriedade privada parte do esforço do homem e de sua atividade na terra e nos objetos. Assim, quando uma pessoa agrega valor a algo esse algo é seu, desde que não cause prejuízo a ninguém.

Ora, mas se o estado de natureza não é um conflito generalizado como pensava Hobbes, o que então, segundo Locke, levaria as pessoas a livremente abandoná-lo e ingressarem no estado político? Se já há uma lei moral racional que limita os impulsos egoístas do homem, qual seria o problema presente do estado de natureza a ser resolvido pelo Estado? Simples: o estado de natureza não seria um estado de guerra e o senso moral dos próprios homens evitaria nele muitos conflitos. Entretanto, não se pode negar que esses conflitos ocorreriam eventualmente e aí é que está o problema. 

Com efeito, apesar de possuir uma lei moral que o regule, o estado de natureza não possui uma autoridade para aplicar essa lei. Assim, quando os conflitos surgem no estado de natureza, apesar de eles não serem tão comuns como pensava Hobbes, o problema é que não há uma autoridade superior a quem os homens possam apelar e, portanto, todos os homens são juízes da lei natural. Como afirmamos antes, o ser humano não é naturalmente bom pra Locke, o que o permite ser tomado pelo egoísmo, vingança ou outro sentimento que o levará a causar mal ao outro. A falta dessa autoridade comum é que levaria os homens a decidirem ingressar no estado político mediante um contrato social. De fato, sem uma instituição a zelar pela justiça, os homens possuem direitos no estado de natureza, mas o aproveitamento desses direitos é incerto.

Por sua vez, uma vez que a função do contrato social lockeano não é garantir a paz, mas sim garantir uma mais eficiente aplicação da justiça da lei da natureza e um mais seguro uso dos direitos naturais, tal contrato não implica, segundo o filósofo, a renúncia completa da liberdade. Ao contrário, como o papel do governo não é tanto manter a ordem, mas sim garantir os direitos básicos, seu poder não deve ser absoluto, mas sim limitado. A lei civil deve apenas exprimir e garantir a perfeita execução da lei natural e dos direitos básicos. Inclusive, para Locke, caso o governo não cumpra com seu papel e viole a lei moral e os direitos naturais, o povo tem o direito e mesmo o deve de se rebelar, afinal, um contrato quebrado não tem mais qualquer valor.

Locke não apenas afirma a necessidade de o Estado ter seu poder limitado, ele propõe uma estrutura para que isso aconteça. Apesar de ser famosa em Montesquieu, a divisão do Estado em poderes já é proposta por Locke, estipulando a existência, na prática, de dois poderes. O legislativo e o executivo. O legislativo seria incumbido de criar as leis e, por isso, seria superior ao executivo. O executivo seria encarregado de administrar pela lei, inclusive atuando na sua interpretação frente a sociedade civil, o que demonstra nesse poder o acúmulo dos poderes hoje conhecidos como executivo e judiciário. Para Locke haveria ainda um terceiro poder, o poder federativo, que trata das questões da pátria frente a outras nações, como o poder de guerra e paz. Na prática esse poder era exercido pelo monarca que também controlava o executivo.