Os antecedentes
O Estado de natureza
Emílio ou da educação
O Contrato Social
As influências do Iluminismo
Em um período marcado fortes mudanças políticas, especialmente pela formação dos Estados nacionais e pelos conflitos religiosos surgidos após a Reforma Protestante, alguns importantes filósofos, conhecidos como contratualistas, tomaram a peito a tarefa de encontrar uma nova resposta para o mais tradicional problema da filosofia política: afinal, por quê e para quê existe a autoridade do Estado? De fato, não há filósofo dedicado ao estudo do governo e das leis, desde a Grécia antiga, que não tenha se colocado diante desta pergunta e buscá-lo respondê-la. Justamente por isso, o que tornou a perspectiva contratualista interessante e inovadora não foi exatamente a questão que ela levantou, mas sim o modo como tentou resolvê-la. Criado pelo pensador britânico Thomas Hobbes, este novo de método para a justificação do poder político foi tão influente que mesmo autores que criticaram duramente as ideias de Hobbes, como Locke e Rousseau, assumiram o método contratualista.
Curiosamente, o raciocínio que fundamenta a metodologia contratualista é algo bastante simples. Em primeiro lugar, se o que está em jogo é descobrir qual é a importância da ordem política, o primeiro passo é imaginar como seria a vida humana sem a política: uma condição chamada por Hobbes de estado de natureza. Uma vez concebido tal estado inicial pré-político, cabe entender o que levaria as pessoas deste estado de completa liberdade e ausência de leis a preferirem abandoná-lo e ingressarem no estado civil e político. Uma vez que no estado de natureza todos os homens seriam totalmente livres, o ingresso no estado político não poderia ser de modo algum imposto e só pode então ser compreendido como um contrato social, isto é, um acordo entre os indivíduos, que livremente abririam mão de sua autonomia completa a fim de constituírem o Estado. Não à toa, é por isso que a corrente iniciada por Hobbes é chamada de contratualismo: segundo esta visão, o que fundamenta e legitima o exercício do poder pelo Estado é um contrato livremente assumido pelos cidadãos em um hipotético estado de natureza. É necessário assinalar esse hipotético, pois os autores contratualistas não necessariamente se comprometem com a ideia de que este acordo foi literal e histórico. Para muitos, o contrato não passa de uma metáfora.
Jean-Jacques Rousseau foi o mais importante filósofo iluminista a se dedicar à filosofia política. Seus textos sobre a origem e os limites do poder do Estado obtiveram enorme repercussão não apenas nos debates filosóficos, mas em toda a sociedade europeia do século XVIII, tendo grande influência, por exemplo, na Revolução Francesa. Tal como Locke e Hobbes, Rousseau era um contratualista. Chegou ele, porém, a conclusões totalmente diferentes dos dois pensadores ingleses. Ao analisar qual seria a condição do homem no estado de natureza, sem qualquer tipo de laço político, totalmente livre e independente, Rousseau não concluiu que esse estado seria de guerra de todos contra todos como pensava Hobbes, tampouco que seria guiado por uma lei natural da razão, de acordo com o que imaginava Locke. Rousseau, na verdade, pensava que o estado de natureza seria um estado de absoluta paz e tranquilidade, mesmo sem qualquer lei, política ou racional, que o regulasse. É que, para o filósofo iluminista, o homem é naturalmente bom; a sociedade é que o corrompe. Segundo Rousseau, sem a intervenção das normas sociais, o homem se comportaria como um animal, guiando-se não pela sua razão, mas sim por instintos (é a chamada “teoria do bom selvagem”). Como, para o filósofo, os instintos mais básicos do homem são o amor de si (interesse pelo próprio bem-estar e conservação) e a piedade (repugnância natural pela morte ou sofrimento de qualquer ser sensível, em especial os semelhantes), então o estado de natureza seria, a princípio, totalmente pacífico, pois os homens jamais se atacariam gratuitamente. Por que, então, surgiu o Estado político? Bem, os problemas no estado de natureza se iniciaram quando surgiu a propriedade privada.
A princípio somente um modo de cada um manter sua sobrevivência, a propriedade acabou por introduzir a desigualdade social, opondo ricos e pobres e gerando uma série de conflitos e lutas por poder. Foi quando surgiu a necessidade de um poder comum para regular a vida das pessoas e as regras de justiça e moralidade ditadas pela razão se tornaram mais importantes que os instintos e sentimentos naturais: surgiu a política. Perceba, porém, que o Estado não surge aí como um bem, mas sim apenas para impedir um mal maior. Ideal mesmo seria que tudo permanecesse tal como antes da propriedade privada. Como, porém, isso não é possível, como o homem já se encontrava irremediavelmente corrompido pela vida em sociedade, então que haja a política. É necessário lembrar, porém, diz Rousseau, que o contrato social não é um acordo entre senhores e escravos, mas sim um pacto político entre iguais para instaurar uma vontade geral que deverá sobrepor-se a todas as vontades particulares. Assim, é necessário diferenciar governo e soberania. Se o governo pode ser exercido por um único indivíduo ou um grupo limitado, a soberania, por sua vez, é e permanece sempre sendo do povo como um todo. Na medida em que o governo não cumpra a vontade geral, o povo tem todo o direito de substituir aquele que não está exercendo corretamente sua função. Não à toa, Rousseau era um crítico do absolutismo considerava a democracia uma forma superior de governo.