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Contexto Histórico

Para a compreensão do surgimento do Realismo na Europa, o professor apresenta a Revolução Industrial como contexto histórico e explica que, rompendo com os padrões da estética romântica, o escritor adota uma postura cientista e conta com quatro teorias filosóficas.

As características gerais

Leitura e análise: " Os Maias" (EÇA)

Realismo e Naturalismo

Leitura e análise de " O Cortiço"

Realismo

Visando combater as fortes influências do Romantismo, no século XIX, o movimento Realista surge com uma reação ao subjetivismo e ao idealismo amoroso. Neste sentido, a literatura, assim como as outras manifestações artísticas desse movimento literário buscou denunciar a hipocrisia das relações sociais frente ao início da formação do cenário burguês, prezando, ainda, por um resgate ao objetivismo.

Contexto histórico

Os principais acontecimentos da metade do século XIX que marcaram o contexto histórico realista são:

  • Valorização das correntes filosóficas científicas que buscavam compreender o indivíduo;
  • Acelerado progresso tecnológico;
  • Revoltas Liberais;
  • Positivismo;
  • Empirismo;
  • Evolucionismo;
  • Influência determinista
  • Características do Realismo

Como o próprio nome da escola já pressupõe, o Realismo lida com fatos, com a realidade do homem e a sociedade em conjunto. Por se desvincular da subjetividade romântica, este movimento propõe uma visão crítica à realidade e às relações junto ao uso de uma linguagem culta e direta. Veja, abaixo, as principais características do Realismo:

  • Objetivismo;
  • Descritivismo;
  • Compromisso com o real;
  • Denúncia da hipocrisia humana;
  • Retrato da mulher com qualidades, mas também, defeitos;
  • Enfoque nos aspectos psicológicos;
  • Herói problemático; 
  • Amor subordinado aos interesses;
  • Apresentação dos costumes/valores da classe média;
  • Universalismo.         


Como menciona Alfredo Bosi, em sua obra História Concisa da Literatura Brasileira (1970): “Do Romantismo ao Realismo, houve uma passagem do vago ao típico, do idealizante ao factual. Quanto à composição, os narradores realistas brasileiros também procuraram alcançar maior coerência no esquema dos episódios [...] por necessidades objetivas do ambiente”. Dessa forma, é possível perceber que, sobretudo ao que corresponde a escola literária em questão no Brasil, surge uma necessidade de evidenciar a realidade da época e transformá-la em literatura. 

Como representantes da escola literária, destacam Machado de Assis e Martins Pena no Brasil e, em Portugal,  Eça de Queirós. 

Trecho da obra “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis. 

Capítulo 7

O Delírio

 Que me conste, ainda ninguém relatou o seu próprio delírio; faço-o eu, e a ciência mo agradecerá. Se o leitor não é dado à contemplação destes fenômenos mentais, pode saltar o capítulo; vá direito à narração. Mas, por menos curioso que seja, sempre lhe digo que é interessante saber o que se passou na minha cabeça durante uns vinte a trinta minutos.

Primeiramente, tomei a figura de um barbeiro chinês, bojudo, destro, escanhoando um mandarim, que me pagava o trabalho com beliscões e confeitos: caprichos de mandarim.

Logo depois, senti-me transformado na Suma Teologica de São Tomás, impressa num volume, e encadernada em marroquim, com fechos de prata e estampas; idéia esta que me deu ao corpo a mais completa imobilidade; e ainda agora me lembra que, sendo as minhas mãos os fechos do livro, e cruzando-as eu sobre o ventre, alguém as descruzava (Virgília decerto), porque a atitude lhe dava a imagem de um defunto.

ASSIS, Machado. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Ed Nova Aguilar, 1994. p 8-9.


O Naturalismo

Quanto ao Naturalismo, embora seja uma corrente do movimento literário realista,  possui um maior enfoque nas classes populares. Assim, a literatura naturalista propõe uma nova maneira de observar a sociedade e denunciar a condição humana e a divisão de classes que surgem com o contexto burguês. É importante dizer que, por ser uma corrente do Realismo, muitas de suas características remetem aos traços realistas, tais como a visão crítica, o descritivismo e a objetividade.


Características do Naturalismo

Veja, abaixo, os aspectos mais marcantes desse movimento:

  • Visão determinista;  
  • Animalização dos personagens;
  • Objetivismo científico;
  • Sexualização do elemento feminino;
  • Impessoalidade;    
  • Descritivismo;
  • Foco no coletivo;
  • Valorização de aspectos biológicos;
  • Despreocupação com a moral;          
  • Linguagem mais simples.

Os grandes nomes dessa época eram Júlio Ribeiro, Domingos Olímpio, Adolfo Caminha, Raul Pompeia e Aluísio Azevedo. Este último é o principal autor da época, e as obras que mais se destacam são “O mulato”, “Casa de pensão” e “O Cortiço” com enfoque de escrita para o romance de tese. 


O romance de tese

O romance de tese tem influência da visão determinista em seu texto, em outras palavras, o narrador tenta mostrar que o homem não consegue vencer e é movido pelas forças no meio, da raça e do contexto histórico. Dessa maneira, há uma valorização dos aspectos patológicos e, para o leitor, a previsibilidade de entender que os personagens não conseguem promover nenhum tipo de transgressão, pois estão vinculados ao Determinismo da época.

Trecho da obra “O cortiço”, na qual o espaço do cortiço é apresentado aos leitores:

Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.

Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo. Como que se sentiam ainda na indolência de neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loura e tenra da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia.

A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros, umedecia o ar e punha-lhe um farto acre de sabão ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostrava uma palidez grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas.

Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas. De alguns quartos saíram mulheres que vinham dependurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se à luz nova do dia.

Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas. Uns, após outros, lavavam a cara, incomodamente, debaixo do fio de água que escorria da altura de uns cinco palmos. O chão inundava-se. As mulheres precisavam já prender as saias entre as coxas para não as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos braços e do pescoço, que elas despiam suspendendo o cabelo todo para o alto do casco; os homens, esses não se preocupavam em não molhar o pelo, ao contrário metiam a cabeça bem debaixo da água e esfregavam com força as ventas e as barbas, fossando e fungando contra as palmas da mão. As portas das latrinas não descansavam, era um abrir e fechar de cada instante, um entrar e sair sem tréguas. Não se demoravam lá dentro e vinham ainda amarrando as calças e as saias; as crianças não se davam o trabalho de lá ir, despachavam-se li mesmo, no capinzal dos fundos, por detrás da estalagem ou no recanto das hortas.

O rumor crescia, condensando-se: o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras na venda; ensarilhavam-se discussões e resingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sangüínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulhavam os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra.

AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço. São Paulo: Ática, 1995, p.35-36.


— Quem me procura?... exclamou João Romão com disfarce, chegando ao armazém.

Um homem alto, com ar de estróina, adiantou-se e entregou-lhe uma folha de papel.

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João Romão, um pouco trêmulo, abriu-a defronte dos olhos e leu-a demoradamente. Um silêncio formou-se em torno dele; os caixeiros pararam em meio do serviço, intimidados por aquela cena em que entrava a polícia.

— Está aqui com efeito... disse afinal o negociante. Pensei que fosse livre...

— É minha escrava, afirmou o outro. Quer entregar-ma?...

— Mas imediatamente.

— Onde está ela?

— Deve estar lá dentro. Tenha a bondade de entrar...

O sujeito fez sina! aos dois urbanos, que o acompanharam logo, e encaminharam-se

todos para o interior da casa. Botelho, à frente deles, ensinava-lhes o caminho. João Romão ia atrás, pálido, com as mãos cruzadas nas costas.

Atravessaram o armazém, depois um pequeno corredor que dava para um pátio calçado, chegaram finalmente à cozinha. Bertoleza, que havia já feito subir o jantar dos caixeiros, estava de cócoras, no chão, escamando peixe, para a ceia do seu homem, quando viu parar defronte dela aquele grupo sinistro.

Reconheceu logo o filho mais velho do seu primitivo senhor, e um calafrio percorreu-lhe o corpo. Num relance de grande perigo compreendeu a situação; adivinhou tudo com a lucidez de quem se vê perdido para sempre: adivinhou que tinha sido enganada; que a sua carta de alforria era uma mentira, e que o seu amante, não tendo coragem para matá-la, restituía-a ao cativeiro.

Seu primeiro impulso foi de fugir. Mal, porém, circunvagou os olhos em torno de si, procurando escapula, o senhor adiantou-se dela e segurou-lhe o ombro.

— É esta! disse aos soldados que, com um gesto, intimaram a desgraçada a segui-los. — Prendam-na! É escrava minha!

A negra, imóvel, cercada de escamas e tripas de peixe, com uma das mãos espalmada no chão e com a outra segurando a faca de cozinha, olhou aterrada para eles, sem pestanejar.

Os policiais, vendo que ela se não despachava, desembainharam os sabres. Bertoleza então, erguendo-se com ímpeto de anta bravia, recuou de um salto e, antes que alguém conseguisse alcançá-la, já de um só golpe certeiro e fundo rasgara o ventre de lado a lado.

E depois embarcou para a frente, rugindo e esfocinhando moribunda numa lameira de

sangue.

João Romão fugira até ao canto mais escuro do armazém, tapando o rosto com as mãos.

Nesse momento parava à porta da rua uma carruagem. Era uma comissão de abolicionistas que vinha, de casaca! trazer-lhe respeitosamente o diploma de sócio benemérito.

Ele mandou que os conduzissem para a sala de visitas.

(AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. São Paulo: Círculo do livro, 1991.)