Nordeste: região das perdas
Crescimento econômico e a migração de retorno
Zona da Mata
Agreste
Sertão e a concentração fundiária
Seca e o projeto de transposição
Meio Norte
Nordeste brasileiro
O Nordeste é uma das 5 regiões do Brasil, contando com 9 estados – Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. Em 2018 apresentava uma população total de 56.760.780 e tem apresentado um crescimento econômico significativo em virtude dos novos investimentos. Para entender o Nordeste hoje, é preciso remontar a formação socioespacial da região, entre perdas e ganhos de crescimento, além de contar com diversos tipos de ocupação.
Ocupação econômica
Quando pensamos na ocupação do território brasileiro, o Nordeste foi o primeiro polo e grande centro do país. A capital, começando a análise a partir da colonização, era Salvador onde se concentrava a gestão e o poder político do país, mantendo também a relação direta com a Europa. Quando saímos do ciclo extrativista do Pau Brasil entrou-se no do açúcar que era muito forte no Nordeste, como também o algodão e o fumo. Existe então um destaque político pela capital e pelo cenário, ou seja, pelo ciclo açucareiro e comércio direto com a Europa. Nesse sentido se destaca também o papel da Baia de Todos os Santos, que se constitua como um grande polo receptor de escravizados, tendo importante papel para o comércio externo.
Com isso, naturalmente o primeiro grande centro político vai virar também o primeiro grande centro populacional. A parte com mais dinamismo, vista como centro, começa a formar a maior ocupação populacional no início da colonização. O Nordeste passou por novas configurações do território começando a vivenciar então as perdas. Isto se relaciona sobretudo a crise do açúcar, que ocorreu paralelamente com outras atividades que começam a ganhar poder como a mineração em Minas Gerais e o café no Vale do Paraíba do Rio de Janeiro se expandindo para o oeste paulista e noroeste do Paraná.
A capital sai de Salvador e passa pro Rio de Janeiro em 1763, estimulado não apenas pelo importante ciclo econômico do café, mas também pela necessidade de controle territorial do extrativismo que ocorria nas minas de Minas Gerais, e que escoavam pelo porto do Rio de Janeiro, agregando valor econômico e político para a região. Isso quer dizer que o grande polo econômico e político passa a ser assumido pelo Sudeste o que estimula um primeiro momento de migração para essa região, já que a cidade do Rio de Janeiro passa a ser dinamizada.
A partir do início do século XX, inicia-se importantes transformações socioeconômicas na estrutura produtiva brasileira. É importante lembrar que, na era Vargas, o processo deindustrialização se deu de modo concentrado no eixo Rio-São Paulo. Isso porque, quem detinha grandes porções de terra no Brasil era a base política e sobretudo econômica do país. Foi necessário contar com o capital acumulado do café, bem como aproveitar da infraestrutura já existente no local. Com isso, o processo de industrialização do sudeste criou empregos e atrativos, estimulando uma nova onda migratória. No Nordeste, concomitante a esse período, começa a exploração do petróleo, com destaque para inauguração da refinaria Landulpho Alves. Entre os anos 50 e 80 o Recôncavo foi o único produtor de petróleo no país. Apesar disso, não se pode dizer que esse desenvolvimento foi capaz de concorrer com o que acontecia no Sudeste por algumas razões. Primeiro, a questão da concentração da renda.
O Nordeste, também por ter sido uma das primeiras áreas ocupadas no Brasil, contou com a divisão de terras que beneficiava os colonizadores europeus. A economia do cacau por exemplo, concentrada na Costa do Cacau (ver mapa abaixo) e as demais economias relacionadas aos produtos primários, eram realizadas nas grandes fazendas a partir da mão de obra escravocrata. Com o abolicionismo, apesar de ainda existir tráfico negreiro na região como consta na bibliografia, a mão de obra era empregada por precárias condições de subsistência. A seca do sertão nordestino também atraia migrantes para a zona da mata e agreste, buscando nas fazendas e polos urbanos melhores oportunidades de vida. Desta forma, a estrutura e organização socioespacial permitia altos níveis de exploração trabalhista e desemprego, já que, além de tudo, a região não contava com o mesmo investimento industrial que o Sudeste.
Nesse contexto, com o intuito de acabar com os “arquipélagos econômicos” que havia entre cada região do Brasil, propondo pela primeira vez um plano integrado de desenvolvimento econômico para cada região do Brasil, surge a SUDENE - Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste em 1959. Esses projetos de desenvolvimento refletiam até certo ponto uma preocupação com a marginalização econômica que algumas regiões do Brasil sofriam à época, visto o forte desenvolvimento industrial concentrado no Centro-Sul, sobretudo em São Paulo. Apesar dessa tentativa de atrair investimentos e expandir a agricultura do Nordeste, existem muitas críticas ao projeto, que não conseguiu ultrapassar os problemas do clientelismo (prática eleitoral de alguns políticos que privilegiam uma população dependente em troca de votos), do coronelismo relacionado a oligarquia agrária nordestina, e da própria indústria da seca, onde a água era concentrada por essa elite e usada como moeda de troca por votos e favores. Lembrando que só quem podia votar no Brasil eram homens, com mais de 25 anos e alto poder aquisitivo, o que começa a mudar em 1891.
As migrações
Sobre as migrações para o sudeste nesse período industrial, podemos reparar o perfil da grande massa migratória do Nordeste para o Sudeste. O perfil do migrante gerou alguns problemas para o nordeste. Pelas estatísticas, o homem adulto principalmente é o perfil que mais migra buscando melhores condições. As mulheres, os idosos e as crianças ficavam no Nordeste e as crianças tinham que ajudar em casa, reduzindo o número de crianças na escola. Essa inserção do migrante no Sudeste também não se dá de formas fáceis e criam as vezes no urbano uma grande mão de obra desempregada e pobre. É preciso lembrar também que houveram fluxos de migrantes nordestinos para o Centro Oeste, em virtude da construção de Brasília, e também para o eixo Norte e Centro Oeste, por políticas de distribuição de terras, fracassadas, que visavam a tentativa de ocupar o interior do Brasil, a partir de 1950.
A partir da década de 90 há um movimento de migração de retorno pois o Nordeste volta a apresentar um crescimento econômico significativo, até maior do que o do Brasil. Isso foi apoiado no crescimento físico e estrutural da região nordeste com projetos de estradas e ferrovias, portos e aeroportos. Esse crescimento estrutural permite maior chegada e saída de pessoas e produtos. O Nordeste passa, nesse período, a crescer de forma rápida e vertiginosa, passando também por problemas de energia como apagões que afasta investimentos. Mas rapidamente conquista projetos de produção de energia, recebendo investimento em eletricidade e transporte, equipando as cidades e voltando a atrair empresários que não conseguem investir com tanta facilidade e tanto lucro nas áreas mais ocupadas do país. O Sudeste, atualmente, se constitui como uma área menos atrativa em investimentos do que o Nordeste, por conta de seu inchaço urbano, alto custo de terras, trânsito, falta de incentivo fiscais, etc. O Nordeste nesse momento se apresenta como uma opção mais barata, atraindo investimentos, aumentando empregos e gerando centros formadores de mão de obra, o que integrou cada vez mais o setor nordeste na economia novamente. A quantidade de senadores eleitos dessa região também a destacam no quesito político. Com esse crescimento, a população que, anteriormente tinha migrado para o sudeste em busca de melhores condições de vida, nem sempre alcançando esse objetivo, vê a oportunidade de retornar para sua região de origem, pelo aumento de oportunidades de emprego e investimentos.
Divisão Regional
Zona da mata: Zona litorânea até o planalto da Borborema, planície costeira nordestina estreita e perto do litoral. Zona muito importante de mata atlântica. Clima chuvoso quente, importante pro contexto de praias. Zona mais ocupada transformada e desmatada de todas. Passou por grandes perdas de área. O crescimento urbano industrial foi de sucesso nesta zona tendo também as grandes praias para o turismo. Atraiu migrantes do interior para o litoral criando cidades superlotadas como Salvador, Maceió, João Pessoa e Fortaleza por exemplo. Atividades se concentram no setor secundário e terciário da economia.
Agreste: Complementa as atividades da zona da mata. Tem como característica o desenvolvimento da policultura no setor primário, que é o desenvolvimento de diferentes gêneros agrícolas abastecendo a zona da mata. Essa prática faz subir alguns índices sociais, ganhando status e polos importantes como Campina Grande na Paraíba. Isso também atrai cada vez mais atividades de caráter urbano. As características culturais também atraem turismo. Em termos de geografia física, temos uma mata de transição ou ecótono, demarcando passagem ou transição de características de variação de clima, entre o sertão com a caatinga e a mata atlântica do litoral. Também apresenta diferentes formas de relevo e temperatura.
Sertão: Representando mais da metade de seu território, com um clima semiárido e índices pluviométricos baixos quando comparado ao restante do país, o associamos comumente a seca e a fome. Sua vegetação é de caatinga e tem a pecuária extensiva como principal atividade das grandes propriedades. O Rio São Francisco é utilizado como principal fonte de água para as populações de suas margens e também é usado para irrigação e para produção de energia com hidrelétricas como a de Sobradinho (BA). O Nordeste é uma região de alta pressão, com correntes de ar que transferem calor para latitudes maiores, favorecendo a estabilidade do tempo e a ausência de chuvas.
Meio Norte: O Meio Norte é encontrado no território dos estados do Maranhão e parte do Piauí. É uma faixa de transição entre o semiárido nordestino e a região amazônica. Apresenta clima tropical com muitas chuvas no verão, e índices pluviométricos maiores a oeste, principalmente por estar mais próximo a região amazônica. A vegetação natural dessa área é a mata de cocais, carnaúbas e babaçus.
O fenômeno da seca e a concentração fundiária
Nesse contexto, a questão social é a mais prejudicada, em grande parte devido à concentração de terras, que limita o acesso a alguns rios perenes, açudes e poços. A água se torna uma barganha política, oferecida em troca da manutenção das relações de poder. O Rio São Francisco é o principal rio que corta a região. Com suas águas perenes, se torna a principal fonte de água para as populações de suas margens e é usado para irrigação e produção de energia, como a Hidrelétrica de Sobradinho (BA).
A importância de suas águas é discutida desde o Brasil Imperial e a transposição de parte de sua vazão para áreas menos favorecidas é antiga. Mesmo assim, a obra de transposição do São Francisco só teve início em 2007. O objetivo é desviar entre 1% e 3% da água do rio a partir de dois canais principais.
Hoje, a obra já se encontra quase totalmente concluída (99%). Foi dividida em dois eixos, Norte e Leste, que são posteriormente subdivididos em outros segmentos menores, levando a água para rios já existentes, mas temporários, além de adutoras e açudes locais, conforme é possível se observar no mapa abaixo.
Projeto de Transposição do São Francisco
Fonte: ALMEIDA, L. M. A. de. Fronteiras da globalização. São Paulo: 3. ed. Ática, 2016.
O impacto dessa transposição no São Francisco é muito discutido. Diversos estudiosos apontam que o volume de água transposto é muito pequeno e não afetaria sua vazão e sempre respeitaria o regime fluvial do rio. Quando o rio apresentasse menor vazão, seria retirada uma menor quantidade de água. Outros apontam que esse volume poderia afetar sim a vida do rio, prejudicando regiões a jusante dos canais de captação.
De qualquer forma, os principais impactos apontados são nos canais de transposição. Para sua construção, foi necessário realizar o desmatamento, o que pode levar prejuízos à biodiversidade. Soma-se a isso que essa transposição pode levar à introdução de espécies exóticas nos rios e açudes já existentes, bem como causar a salinização do solo e isolamento de espécies, que não conseguiriam migrar de uma margem para outra. Outro ponto muito criticado é que, se não corrigisse a estrutura fundiária da região, o acesso à água, mesmo com a transposição, seria limitado, mantendo ou reforçando as estruturas de poder local, além de que facilitaria a expansão agrícola de grandes proprietários, gerando maior concentração de terras. É nesse sentido que se pode afirmar que o problema do Sertão não é a seca, e sim a cerca.