Guerra Fria e Militarismo
Revolução Cubana e a Doutrina Mann
Nacionalismo ou Socialismo?
A Sustentação das Ditaduras
A Ditadura Brasileira
A Ditadura Argentina
A Redemocratização
Militarismo, Ditaduras e Redemocratização na América Latina
A Ditadura Militar no Brasil.
Institucionalização do regime.
O amplo apoio de setores da população civil ao golpe militar de 1964 – como os empresários, parte da classe média e até mesmo setores da Igreja Católica – levaram os historiadores a chamarem este episódio de golpe “civil-militar”. O golpe também teve apoio do governo norte-americano, que o considerava o caminho certo para afastar uma possível “ameaça comunista” do Brasil no contexto de Guerra Fria. É importante lembrar que Cuba acabava de passar pela sua Revolução, ampliando o temor estadunidense de que os ideais socialistas se espalhassem pela América.
Logo em seguida ao golpe, foi organizado o Comando Supremo da Revolução que contava com a participação dos militares chefes da marinha, do exército e da aeronáutica. Com a deposição de Jango do cargo de chefe do executivo no dia 31 de março de 1964, a presidência foi assumida interinamente por Ranieri Mazzilli, mas comandada de fato pelo alto comando das Forças Armadas brasileiras até a chegada de Castelo Branco ao poder. A partir de então, teve início a ditadura militar brasileira que durou 21 anos, um período de intensa repressão e cerceamento da liberdade de expressão dentro do país.
A perseguição e a censura foram instauradas desde o princípio com o intuito de combater qualquer pessoa tida como inimigo do regime que seria automaticamente considerado inimigo da nação. Diversos políticos tiveram seus mandatos cassados, pessoas foram perseguidas, vigiadas, presas, exiladas e torturadas em nome da “segurança” do país.
Com a desculpa de manter a ordem, o que na verdade se converteu em um mecanismo que facilitou a repressão da população no geral, foram criados Atos Institucionais que permitiam a alteração da constituição de forma a garantir os interesses dos militares. O Ato Institucional de número I (AI – I) foi decretado logo em seguida ao golpe e garantia, entre outras coisas, a eleição indireta para presidente, a cassação de mandatos e direitos políticos por 10 anos e a possibilidade de decretar estado de sitio no país sem consultar previamente o Congresso.
O decreto tinha a intenção de concentrar os poderes na mão do chefe do executivo, facilitando assim a instalação de mecanismos de controle e censura que foram largamente utilizados pelos presidentes militares.
A partir do decreto do AI –I, diversos movimentos foram colocados na ilegalidade, como os sindicatos e a UNE (União Nacional dos Estudantes), políticos tiveram seus mandatos cassados e funcionários públicos e professores foram aposentados compulsoriamente. Os meios de comunicação passaram a ser constantemente vigiados e aqueles que se opunham ou criticavam os militares sofriam com constantes ataques as suas sedes. Diversos jornalistas foram presos e exilados, assim como muitos artistas, que a partir daqui precisavam submeter seus trabalhos a aprovação do regime.
Foram criados e reativados mecanismos oficiais para dar conta desse controle, como o Serviço Nacional de Informações (SNI) que era um serviço secreto da ditadura que tinha como função vigiar e controlar toda e qualquer atividade ou pessoa considerada suspeita. O Departamento de Ordem Política e Social (Dops), criado durante o Estado Novo, foi reativado e dentre suas diversas funções, estava o monitoramento a nível estadual de órgãos e pessoas considerados suspeitas, como faculdades, militantes e etc. Além disso, foi criado a partir da Operação Bandeirantes (1969), criada em conjunto com a iniciativa privada para combater as guerrilhas em São Paulo, o Departamento de Operações Internas e Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), que servia como um braço da perseguição a todos que fossem considerados suspeitos de colocar a segurança nacional em risco.
O regime militar foi se consolidando ao longo do governo de Castelo Branco com a promulgação do Ato Institucional de número 2 e 3, que dentre diversas coisas, instituía o bipartidarismo no Brasil, permitindo somente a existência de dois partidos políticos: o ARENA - Aliança Renovadora Nacional e o MDB - Movimento Democrático Brasileiro.
O primeiro era o partido dos militares e o segundo pertencia à oposição consentida pelo governo. Além disso, foi promulgado ainda em 1967 a Lei de Imprensa e a Lei de Segurança Nacional que promoviam uma diminuição dos direitos civis e a confirmação institucional do cerceamento da informação e da liberdade de imprensa. No mesmo ano, foi criada uma nova Constituição que serviu para consolidar a instalação do regime ditatorial no país, porém foi necessária a promulgação do AI-4, devido a protestos de ambos os partidos, permitindo o retorno do Congresso e a formação de uma Assembleia Constituinte para a criação da nova carta constitucional.
Os Anos de Chumbo
O ano de 1968 ficou conhecido na história como o “Ano que não terminou”, marcando um período intenso na política e na produção cultural ao redor do mundo. Além de assassinatos como o do Pastor e líder Martin Luther King, do Senador norte-americano Robert Kennedy, também marcaram presença a Guerra do Vietnã, o auge do movimento Hippie, a Primavera de Praga, os protestos do Maio de 68, na França e, na América Latina, os diversos atos contra os governos autoritários.
No Brasil, não diferente, eventos como a “Passeata dos cem mil” e a morte do estudante Edson Luís demonstram a tensão que se construía entre a Ditadura e seus opositores. A resposta do Governo para essa intensificação nos atos foi, primeiramente, a proibição de manifestações em ruas de todo o país pelo Ministro da Justiça, em 5 de julho. Em seguida, em um ato ainda mais radical do Governo, é decretado em dezembro de 1968 o Ato Institucional Nº5 (AI-5).
Assinado pelo presidente Arthur da Costa e Silva, o AI-5 legitimava o fechamento do Congresso Nacional, das assembleias legislativas e das câmaras municipais. O ato permitia ao chefe do Executivo, no caso, o presidente, o poder de cassar os mandatos legislativos, executivos, federais, estaduais e municipais, ou seja, concedia plenos poderes ao presidente que podia, ainda, suspender os direitos políticos dos cidadãos, demitir, remover, aposentar funcionários civis e militares.
O texto indicava também plenos poderes para demitir e remover juízes, decretar estado de sítio sem restrições ao país, legislar por decreto e baixar outros atos institucionais completares. Por meio do texto, o governo retirou o direito a habeas corpus (liberdade provisória enquanto responde ao processo) aos acusados de crimes contra a segurança nacional. Esses acusados passaram a ser julgados por tribunais militares sem direito a recorrer.
Este é considerado um dos capítulos mais tristes da história republicana brasileira. Com Emílio Garrastazu Médici (1969-74) na presidência, a tortura foi instituída contra aqueles que se opusessem ao regime. Muitos morreram, desaparecem ou foram obrigados a partir para o exílio. A tortura se intensificava enquanto no plano econômico os militares ressaltavam os avanços do dito “milagre econômico”.
Assim, apesar das perseguições, prisões arbitrárias e torturas ocorrerem nos porões da ditadura, silenciando opositores, o país passava uma imagem de tranquilidade e crescimento para a população. Com o “milagre econômico” (que apesar do enriquecimento, gerou uma alta concentração de renda e aprofundou as desigualdades) e a conquista da Copa do Mundo de 1970, o clima de euforia se intensificou, ajudando, portanto, a criar a falsa imagem de um país próspero e que se modernizava. Aproveitando o contexto, o regime construiu um forte esquema publicitário, que apelava para o nacionalismo e para a marginalização dos opositores, lançando campanhas ufanistas com frases como “Brasil, ame-o ou deixe-o” e “Brasil
Potência”.
O chamado “Milagre econômico” fundamentou-se em duas bases: de um lado, um endividamento externa para a obtenção de tecnologia estrangeira; e de outro, na ampliação do mercado consumidor de tais produtos (consumidos principalmente pela classe média). No período entre 1964 e 1978, a dívida externa brasileira passou de 2,5 bilhões para 40 bilhões. Esse modelo, além disso, promoveu um processo de concentração de renda, excluindo do poder de compra milhões de pessoas. Deste modo, apesar de garantir o crescimento econômico, tornou inevitável o afloramento de graves tensões sociais, o que era sufocado pela crescente repressão do período.
Todo esse desenvolvimento econômico levou a um aumento significativo o PIB do país e uma falsa sensação de crescimento com a diminuição da inflação. Além de tudo, aumentando o clima de euforia com o crescimento do país houve um aumento nas bolsas de valores brasileiras e a expansão e o investimento nas indústrias de base brasileiras. Todo esse suposto progresso veio acompanhado de “obras faraônicas” (chamadas assim por serem obras muito grandes e em alguns casos sem muita utilidade) que aumentaram a oferta de empregos e melhoraram a infraestrutura do país, como no caso da Ponte Rio-Niterói.
Os Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs) foram responsáveis pela sistematização da pretensão dos militares com relação ao crescimento do país. A ideia era torna-lo uma nação desenvolvida em um curto espaço de tempo investindo em indústrias através da união do capital nacional e o estrangeiro para investir em áreas essências para esse crescimento. Soma-se a tudo isso a ideia de integrar as áreas mais distantes do Brasil e não tão produtivas. Foi dentro desse contexto que ocorreu a construção de diversas hidroelétricas e o investimento em bens de capital.
Esses planos ainda contemplavam outras áreas como a nutrição, a habitação, a educação, a saúde e o saneamento básico. O que no papel parecia muito bonito e na prática se mostrava eficaz para os interessados, vai sofrer um baque quando esse modelo desenvolvimentista mostrar sinais de esgotamento logo em seguida, em meados da década de 1970.
Resistência
Embora a repressão tenha ocorrido de forma contínua ao longo de todo o regime, as manifestações de resistência também se fizeram presente. A resistência se deu em diferentes momentos e de diversas formas: guerrilhas urbanas e rurais com a luta armada, no campo cultural através das canções-protesto e a manutenção de uma arte mais crítica, manifestações nas ruas (ainda que tenham sido fortemente reprimidas), greves, mobilizações estudantis, entre outras.
As manifestações culturais ficaram mais conhecidas com o surgimento do Tropicalismo e das canções-protesto que através de letras dúbias promoviam críticas ao regime. Cantores como Geraldo Vandré, Caetano Veloso, Gilberto Gil, entre tantos outros foram amplamente perseguidos, censurado e muitos foram exilados devido a repressão do regime militar.
A participação do Teatro de Arena, Teatro Oficina e do movimento do Cinema Novo foram essenciais pela criação de uma frente de resistência e denúncia contra a censura instalada no país e também por promoverem um movimento de pensar um novo Brasil e uma nova arte com caráter nacionalista que abrangesse as diferenças existentes no país.
Embalados por pelo clima de insatisfação e de constante privação de direitos, a população, principalmente o movimento estudantil, promoveram uma série de atividades de resistência contra a manutenção dos militares no poder. Não coincidentemente, o ano de 1968 foi de efervescência cultural e política ao redor do mundo com o surgimento de movimentos que criticavam a ideologia dominante e seu modus operandis, como o movimento hippie, os movimentos estudantis de Paris e a Primavera de Praga. O movimento mais famoso no Brasil ficou conhecido como a Passeata dos Cem Mil, porque cerca de 100 mil pessoas ocuparam a Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro, durante o protesto que pedia o fim do regime militar. Apesar de não terem nenhuma das suas reivindicações atendidas, os protestos marcaram a participação da população civil contra a imposição do governo militar e ao mesmo tempo deram um impulso para o recrudescimento do regime.
O processo de redemocratização com Geisel e Figueiredo.
A Ditadura Militar brasileira vigorou no Brasil no período de 1964 até 1985, ou seja, foram quase 20 anos de ausência de democracia. A redemocratização brasileira se deu oficialmente com o fim do Governo de João Batista Figueiredo, mas não foi algo simples e rápido: a abertura política foi um processo lento, gradual e seguro, que começou a dar os ares no início da década de 70. O milagre econômico, que gerou um crescimento econômico exponencial durante o governo Médici e contribuiu para a legitimidade da ditadura começou a dar sinais de esgotamento, provocado principalmente pela crise do petróleo, do aumento da dívida externa e o aumento da inflação. Em meio ao fim do período de crescimento e com a queda real do PIB, cresceram as insatisfações e questionamentos à ditadura militar. O mandato de Médici chegava ao fim e era necessário que o próximo presidente fosse alguém capaz de lidar com essas inquietações.
O general Geisel foi o escolhido para suceder o general Médici. Diante das críticas à crise econômica e às próprias bases da ditadura militar brasileira, ele foi o escolhido para iniciar o processo de abertura política que segundo suas próprias palavras seria: lenta, gradual e segura. Esses foram os primeiros passos dados em direção a redemocratização do Brasil. Mas por que deveria ser uma “abertura lenta, gradual e segura”? Por que não acabaram com a ditadura de uma vez? Diante do barril de pólvora que o Brasil se encontrava, com o crescimento da oposição ao regime, foi necessário que a redemocratização ocorresse devagar, sem que houvesse qualquer “retrocesso” e de modo a garantir os interesses das elites dominantes. Antes de tudo, era importante que fosse segura, principalmente, para os militares, que cometeram uma série de excessos durante o período ditatorial e que claramente perceberam que não poderiam se manter no poder infinitamente. Até porque já havia uma polarização dentro das forças com relação à forma de governar o país, o que causou um desgaste nas relações internas entre os próprios militares.
Economia nos anos 70.
Em 1973, como visto, o período do Milagre Econômico chegava ao fim deixando uma enorme dívida e uma inflação cada vez maior. Geisel precisou lidar com a crise do petróleo ocasionada devido ao embargo imposto pela OPEP - Organização dos Países Árabes Exportadores aos países que apoiavam o país recém-criado, Israel. Durante a Guerra do Yom Kippur e outros conflitos na região oriental do globo, elevaram drasticamente o valor do barril de petróleo no resto do mundo.
Além disso, os abundantes empréstimos que eram concedidos ao país durante os governos militares anteriores diminuíram drasticamente, o que encurtou os recursos disponíveis para investimento nas áreas essenciais do país. A Criação do II Plano Nacional de Desenvolvimento em 1975 veio com intuito de reestruturar a economia do país e criar possibilidades de manter os investimentos em áreas estratégicas, como a energética. A crise do petróleo, que era principal fonte de energia utilizada pelo país naquele momento, apontou para a dependência do Brasil em relação aos outros países produtores.
A solução encontrada pelo governo foi investir em bens de capital e infraestrutura, ampliando a produção da cadeia industrial do país. Além disso, aumento o investimento em fontes de energias alternativas e uma série de investimentos na agropecuária. A intenção do plano era tirar o país da crise e mais do que isso, fazê-lo voltar a crescer. O II PDN teve um sucesso parcial, entretanto não conseguiu colocar em prática tudo aquilo que se propôs a fazer. No final do mandato de Geisel, a dívida externa estava ainda maior, bem como a taxa de inflação.
Abertura Política
O general Geisel deu início à abertura política brasileira, mas não foi um processo tão tranquilo. Costuma-se dizer que o governo de Geisel se baseou no binômio “sístole e diástole”, bem parecido com o que você aprende nas aulas de sistema circulatório. Durante seu governo, foram implementadas medidas de relaxamento e abertura (diástole), mas também medidas de contenção, repressoras, quando o presidente considerava necessário (sístole), o que pode ser percebido com as torturas, prisões e assassinatos que se mantiveram no período, como o do jornalista Vladmir Herzog.
Dentro desse contexto, diversas medidas contraditórias serão tomadas pelo então presidente do Brasil. Já em 1974 ocorre a liberação da propaganda eleitoral gratuita o que vai ajudar na vitória da oposição consentida, o partido do MDB, que conquistou um sucesso expressivo nas eleições. É importante salientar que isso demonstrou uma insatisfação generalizada com o modelo militar. Entretanto, faz-se necessário contextualizar que essas vitórias não modificaram drasticamente as bases governamentais uma vez que a oposição não diferia tanto do projeto dos militares.
Embora tenha ocorrido a liberação parcial das mídias, a repressão continuou a todo vapor como é constatado na morte do jornalista que foi citado a cima, Hergoz e na morte de outros opositores durante o período, como Manuel Del Filho. Ambos os opositores foram encontrados mortos no DOI-CODI com sinais de tortura, o que vai despertar a atenção da mídia internacional sobre o caráter brutal e repressivo do governo brasileiro. Além disso, gerou uma grande comoção nacional e uniu diversos setores da sociedade que questionavam os meios utilizados pela ditadura, inclusive grupos que anteriormente haviam apoiado os militares, como a classe média e a Igreja Católica.
Com interesse de aprovar um projeto que reformulasse o Poder Judiciário juntando com a preocupação que a crescente manifestação contra o regime poderia causar nas eleições que estavam próximas, em 1977 será lanço do Pacote de Abril que arrochava as medidas políticas durante o período de “abertura”. As principais medidas foram:
· Fechamento do Congresso
· Aumento do mandato presidencial para 6 anos
· Continuidade eleições indiretas para Presidente da República, prefeitos e governadores.
· Determinava que 1/3 dos senadores seriam indicados pelo presidente (esses senadores ficaram conhecidos como “senadores biônicos”)
· Aumento das bancadas de estados menores (O ARENA possuía uma quantidade significativa de representantes nesses estados)
· Criação da Lei Falcão (que instituía uma censura nas propagandas eleitorais)
Movimentos de Resistência na década de 1970.
Após um período de desarticulação, o movimento estudantil vai ganhar força novamente entre meados da década de 1970. Intelectuais de esquerda ou não, promoveram uma articulação importante contra a ditadura, principalmente nesse momento de “abertura” política. Já no final da década de 70, vários órgãos criados anteriormente pelos alunos ressurgiram com grande força levando a mobilizações e protestos a favor da democracia.
Assim como o movimento estudantil havia se reorganizado e promovia uma série de manifestações contra a ditadura militar, os trabalhadores seguiram o mesmo curso. Essa reestruturação ficou conhecida como Novo Sindicalismo. Uma série de greves eclodiu no país durante o governo de Geisel para reivindicar condições melhores de vida devido ao arrocho salarial e ao alto custo de vida. É importante lembrar que, como falamos lá em cima, nesse momento o “milagre econômico” já havia chegado ao fim e o país passava por uma crise econômica.
É dentro desse contexto que no ano de 1978 vai eclodir uma série de greves, principalmente de operários do setor metalúrgico, na cidade de São Paulo. A reconfiguração dos sindicatos levou a paralisação de milhares de trabalhadores do ramo industrial que reivindicavam, principalmente, aumento salarial. Essas greves no ABC Paulista contaram com a participação do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, que já em 1980 vai despontar como um dos principais líderes sindicais do Brasil.
Argentina no século XX
Durante o século XX a América Latina vai passar por diversas fases em comum, como os governos populistas e as ditaduras. A Argentina não vai ficar de fora desse padrão, sendo palco de importantes movimentos políticos e sociais, principalmente após a Segunda Guerra Mundial. O país vai passar por momentos políticos conturbados, marcado por diversos golpes militares durante o século citado que tinham a intenção de barrar seja o aumento da participação popular ou a ameaça do comunismo.
O início do século XX foi extremamente conturbado para o povo argentino. O final do século anterior e o início do século XX foi marcado por um período de prosperidade econômica na sua capital Buenos Aires, conhecida como Belle Époque Argentina. O país era um grande produtor agrícola e pecuário com relações comerciais com a Europa, principalmente com a Inglaterra.
Com diversos golpes militares em sua história, a década de 1930 será conhecida como a Década Infame. Iniciado com um golpe militar, o período será marcado por uma série de fraudes eleitorais, forte repressão aos opositores do regime e grande corrupção. Inserido no contexto da Crise de 29, o país ainda será palco de um intenso êxodo rural e um investimento forçado em industrialização devido às novas demandas provenientes da crise econômica mundial. A década histórica vai acabar com um novo golpe militar e ascensão do grupo GOU ao poder.
Ascensão do Populismo
Em 1943 ascende ao poder através de um golpe militar o grupo GOU - Grupo de Oficiais Unidos, composto por uma união entre conservadorismo, militarismo e catolicismo. O novo governo foi marcado por uma forte repressão e perseguição aos seus opositores. Como o resto da América Latina, o perigo que rondava a todos eram os ideais comunistas que precisavam ter seus focos eliminados. E assim se propagou uma série de ataques a instituições educacionais, a intelectuais, sindicatos e movimentos populares com a desculpa de garantir a ordem social.
É dentro desse panorama que Juan Domingo Perón surge ocupando importantes cargos dentro desse governo. Com uma política de aproximação com os sindicatos e com os trabalhadores, Perón vai conseguir importantes avanços nos direitos trabalhistas e garantir o apoio do proletariado em torno da sua figura. Sua rápida ascensão e popularidade levaram a uma preocupação por parte das elites que o retiraram do cargo e o prenderam em 1945. Contudo, o tiro vai sair pela culatra porque a população, principalmente o proletariado e os sindicatos, tomou as ruas em apoio a Perón e exigiu sua libertação.
Peronismo
Juan Domingo Perón foi eleito presidente em 1946 e posteriormente reeleito em 1951 e mais a frente em 1973. Implantou um programa social apoiado pelo Partido Justicialista criado por ele e conhecido como Partido Peronista. Foi um presidente populista de caráter nacionalista e também paternalista. Aproveitando que a Argentina vivia um cenário econômico favorável, Perón contou com o apoio operário para aplicar seu modelo governamental. Junto de sua esposa Evita Perón, enquanto esteve à frente do governo, intensificou o controle do Estado sobre a economia, nacionalizando vários setores (indústria, transporte, energia)
Governando através da dicotomia entre o populismo e o autoritarismo, almejava um crescimento econômico e o estabelecimento da soberania nacional. No âmbito socioeconômico, aumentou os salários, criou mais empregos e ampliou os direitos trabalhistas argentinos. Promoveu a ampliação da malha ferroviária e do sistema de saneamento básico, além disso, investiu na ampliação e na melhoria do sistema educacional e do sistema de saúde argentino.
Comparado ao “Varguismo” no Brasil, exercia controle sobre os sindicatos com intuito de evitar manifestações contrárias ao seu governo e utilizava a propaganda como forma de popularizar sua imagem. Promoveu a censura em diversos espaços e instituições, especialmente a partir do seu segundo mandato aumentou o fluxo das medidas autoritárias. Somado a isso, a crescente inflação a partir de 1951 vai fazer com que Perón perca o apoio de importantes organizações e que a oposição ao seu governo aumente.
Junto com seu marido, Evita Perón foi de suma importância para a popularização do governo populista. Comandou as manifestações a favor da liberdade de Juan em 1945. Já como primeira-dama, atuava junto aos sindicatos e promoveu uma série de campanhas em defesa dos direitos das mulheres. O sufrágio feminino foi aprovado durante o governo Perón, assim como a igualdade jurídica entre homens e mulheres. Inaugurou em 1948 a Fundação Eva Perón, onde prestava assistência a população mais pobre do país. Evita veio a falecer em 1953 de um câncer cervical.
Golpe Militar
No seu segundo mandato Perón começa a perder boa parte de sua base de apoio. As Forças Armadas que até então eram aliadas do presidente, começam a se opor ao seu governo porque ele começa a negociar com empresas estrangeiras a cerca da exploração do petróleo. Outra instituição que também vai retirar seu apoio a Perón é a Igreja Católica, que vai ver como uma ofensa a revogação da lei que obrigava o ensino católico nas escolas e a promulgação de uma nova lei que separa a Igreja do Estado.
A partir de 1953 a oposição começa a utilizar mão do terrorismo para tirar o então presidente do poder. No mesmo ano, Perón vai sofrer um atentado a bomba evidenciando o caráter radical da oposição. Em 1955, devido às conspirações, o presidente declarou o Estado de Guerra. Logo em seguida, a Casa Rosada (residência oficial do presidente argentino) sofreu um no atentado aonde mais de 300 pessoas morreram.
Ainda em 1955 ocorre um novo atentado com o apoio de comandos civis revolucionários, que combateram as tropas leais ao presidente Perón em Alta Córdoba e mantiveram grupos armados em diferentes pontos do país, ocupando edifícios públicos. É o fim do governo peronista. Perón é deposto e vai se exilar na Espanha. Após a sua saída, Eduardo Lonardi nomeia a si mesmo como Presidente Provisório da Nação.
Revolução Libertadora
Em 1966 ocorre mais um golpe militar na Argentina com a deposição do presidente Arturo Illia. O movimento se autodenominava de “Revolução Libertadora” e assim como qualquer ditadura foi marcada pela forte repressão e censura. Ocorreram vários massacres por parte do governo que reprimia duramente os protestos contra o regime militar, principalmente dentro das universidades, o que levou a um número grande de intelectuais exilados. Ocorreu uma maior abertura econômica para o capital estrangeiro e uma quantidade significativa de obras de infraestrutura. O período ditatorial foi até 1973, quando após uma pressão interna da população ocorre a volta de eleições democráticas que levaram Juan Perón ao poder novamente.
Retorno de Perón
Juan Perón volta a Argentina em 1972 e logo no ano seguinte concorre as eleições após a renúncia de Héctor Cámpora. É reeleito, contudo não chega a governar por tanto tempo porque morre logo no ano seguinte, 1974. Como sua esposa, Isabelita Perón, era sua vice-presidente ela assume o cargo após a sua morte. Entretanto, Isabelita também não vai governar por muito tempo, pois apenas dois anos depois (1976) uma junta militar se reúne e dá um novo golpe militar no país.
Ditadura Civil-Militar
A deposição de Isabelita não passou de um golpe chefiada por uma junta militar composta pelos chefes das principais forças militares argentinas. Novamente o país entrava em uma ditadura militar após apenas três anos de um governo democrático. Esse foi o último regime ditatorial no país e foi marcado pela sua violência com os opositores. Alguns historiadores acreditam que ela começou na verdade com a deposição de Perón em 1955 e apenas passou por uma interrupção em 1973.
O fato é que o novo governo contou com o apoio de parte da população, principalmente das elites que após a Revolução Cubana viram a ameaça socialista tomar forma no continente americano, não se pode esquecer que nesse momento o mundo estava vivendo a Guerra Fria. O medo do retorno de governos de caráter populista também rondava o país, então a intervenção militar foi defendida como forma de garantir a ordem. Além disso, a grave crise econômica, política e social do país foram fatores importantes para justificar e legitimar o golpe.
Afirmando que o país passava por um Processo de Reorganização Nacional, os militares iniciaram um rápido processo de caça aos opositores do regime que ficou conhecido como, Guerra Suja. Diversas pessoas foram sequestradas e levadas para o que ficou conhecido como “os centros clandestinos de detenção”, chegando lá passavam por procedimentos de tortura até serem assassinados. Uma das formas mais comuns de eliminar esses corpos era jogando-os ao mar, o que faria com que eles não fossem encontrados. Outra prática muito comum era o sequestro de bebês de pais considerados “subversivos”, seus filhos eram levados de dentro de suas casas ou então de dentro do cárcere (casos de mulheres que foram presas grávidas).
Estima-se que mais de 30 mil pessoas tenham desaparecido ou sido mortas durante a ditadura argentina. O aparelho repressivo foi tão brutal que deu início a um movimento chamado Mães da Praça de Maio em 1977. Essas mães promoviam passeatas para pressionar o governo sobre os desaparecimentos de seus filhos e denunciar as ações cometidas contra os direitos humanos pelos militares argentinos. Muitas dessas mulheres foram perseguidas e mortas pelo regime. Ainda hoje o grupo atua tentando encontrar as crianças vítima de sequestros e que foram adotadas por outras famílias. Atualmente o grupo conta com a participação das Avós da Praça de Maio.
Guerra das Malvinas
Os militares que já vinham perdendo prestígio dentro do país decidem entrar em guerra para disputar o território das Ilhas Malvinas contra o Reino Unido em 1982. A invasão também seria uma forma de unir a população e fazer com que ela “esquecesse” as críticas ao regime e pelo interesse antigo de ocupar a ilha tão próxima do seu território. A Inglaterra respondeu rapidamente a invasão argentina ao seu território e impôs uma derrota expressiva a Argentina e aos militares em menos de dois meses. O que já não ia bem vai ficar pior ainda. Envoltos em uma crise econômica e sendo cada vez mais questionados devido aos crimes cometidos contra aos direitos humanos, a derrota ajudou a pôr fim ao regime militar na Argentina.
A Ditadura militar chilena.
O golpe de Augusto Pinochet.
Em toda a história chilena, a participação militar na política sempre foi tímida, diferente de países como Brasil, que vivia então uma ditadura militar. No entanto, a crise deflagrada durante o governo Allende, o temor ao socialismo e o apoio dos E.U.A levaram a ala militar a uma nova estratégia.
Em setembro, pressionado pela ala militar, o General Prats, grande defensor da Constituição e importante nome na defesa contra tentativas de golpes, renunciou ao cargo de comandante em Chefe das Forças Armadas. Para o seu lugar, Allende indicou o General Augusto Pinochet.
Não demorou muito para que no dia 11 de setembro, Pinochet iniciasse um movimento golpista em Santiago. Na manhã deste dia, militares cercaram diversos complexos industriais e com apoio aéreo norte-americano invadiram o Palácio La Moneda. Allende, sempre um defensor do pacifismo, decidiu não apoiar uma revolução armada ou uma guerra civil.
Visto isso, os aviões bombardearam o palácio, mesmo com o presidente em seu interior, que acabou assassinado pelo golpe de Estado mais sangrento da história do país. Terminava assim o governo socialista de Salvador Allende e começava, enfim, a ditadura de Augusto Pinochet.
Os 17 anos de governo Pinochet se tornou um movimento contrarrevolucionário. Assim como as ditaduras no Brasil e na Argentina, com apoio norte-americano, visou derrotar a ameaça socialista no país e na América e garantir a permanência do capitalismo. Entretanto, para garantir esse cenário, Pinochet transformou o país em uma ditadura que promoveu a perseguição, exílio e assassinato de milhares de pessoas. Estima-se que o regime tenha assassinado aproximadamente 3.000 pessoas e forçado cerca de 200.000 ao exílio, além outros de milhares de torturados.
Apesar de um plano político extremamente conservador, com intervenções arbitrárias do Estado, no plano econômico, houve uma forte adoção das teorias neoliberais. Formado por um grupo de economistas conhecidos como os “chicago boys”, o governo de Pinochet desestruturou toda a formação socialista de Allende para um capitalismo de livre mercado. Apesar do desenvolvimento econômico do período, o legado da política neoliberal para o país foi a criação de um abismo social que atinge até hoje o país.
Durante a década de 1980, a imprensa internacional e associações de Direitos Humanos, inclusive norte-americanas, passaram a denunciar os crimes do ditador. Suas práticas violentas, as perseguições, torturas e mortes estamparam capas de jornais no mundo inteiro. Essa pressão internacional, somada a insatisfação popular no país levou Pinochet a realizar, em 1988, um referendo popular que decidiria a continuidade do seu governo.
A grandiosa campanha do “No” conquistou a vitória na eleição, enfim levando ao fim, em 1988 a ditadura chilena, que voltou a encontrar eleições em 1989 e se redemocratizar em 1990. Pinochet, assim, abandonou a presidência, mas mantendo cargos como senador vitalício e comandante em chefe do exército chileno até 1998, quando foi preso acusado de corrupção e crimes contra a humanidade.