A vegetação e o clima africano
Bacias Hidrográficas africanas
O clima tropical e a vegetação africana
A organização territorial dos países africanos
A construção do território africano
A questão agrária no território africano
Atual questão política na África
A África é o terceiro maior continente do mundo. Ao todo são 54 países africanos, contendo uma enorme diversidade de climas, paisagens e culturas. De totais desertos a climas equatoriais chuvosos, a África possui uma população que reflete a diversidade da extensão territorial do continente, com cerca de 130 etinias diferentes, além de existirem mais de mil idiomas no continente. Vamos estudar como o continente que foi o berço da humanidade hoje enfrenta consequências e perspectivas de processos históricos passados.
Não podemos ignorar o fato de existirem uma série de estigmas negativos atribuídos ao continente Africano. Não é incomum que pessoas achem que a África é um país por exemplo, e que não conheçam nada além da história da fome e da pobreza. Isto é consequência de um processo de apagamento da história africana, a partir da invenção colonial da África e dos processos imperialistas sobre o continente. Esses estigmas construídos podem atrapalhar o processo de aprendizagem e limitar nossa visão de mundo. Por isso, antes de começarmos, que tal assistir a esse vídeo da escritora Chimamanda Adichie chamado “ O perigo de uma história única”?
Aspectos físicos: clima e regiões da África
• Na África do Norte se encontra o predomínio de clima árido, semiárido e mediterrâneo, com destaque para o deserto do Saara. Ali existe a conexão com o Mar Mediterrâneo, sendo uma área de fronteira entre Europa Ásia e África. Também nessa área passa o rio Nilo, que nasce nas regiões centrais mais úmidas, segue pelo deserto e desagua no mar mediterrâneo. Foi nele que as primeiras civilizações desenvolveram técnicas de irrigação que permitiam plantio mesmo numa região árida.
• Existe, ainda, uma faixa de transição entre a África Saariana e a África Subsaariana que chamamos de Sahel. Ali predomina uma vegetação de savana. Quanto maior a disponibilidade hídrica vai aumentando, em direção ao sul, mais o adensamento florestal se torna perceptível. É nessa região que existe um importante projeto de reflorestamento chamado cinturão verde, onde árvores frutíferas e alimentares são plantadas para conter o avanço da desertificação do Saara. Essa ação humana tem sido responsável pelo aumento da biodiversidade, e pelo incremento de umidade na região.
• A África Subsaariana, ou seja, abaixo do Deserto do Saara, podemos identificar o predomínio de um clima mais úmido, tropical e equatorial de acordo com as latitudes. Ali temos o destaque para produção agrícola. Pela influência equatorial, podemos encontrar também a Floresta do Congo, de grande biodiversidade.
• Mais ao sul, se distanciando do trópico de capricórnio, o clima volta a ser desertíco também pela influência de correntes marinhas frias. Ali encontramos o Deserto da Namíbia e do Calaari. Enquanto mais ao leste, uma corrente quente do Madagascar permite uma maior abundância de chuvas na África do Sul.
Uma forma comum de regionalizar a África é a partir da divisão do deserto do Saara. Por se tratar do segundo maior deserto do mundo, sobretudo nos tempos antigos, esta fronteira estabelecia uma divisão bem delimitada. Os povos acima do deserto do Saara possuiam maior contato com os povos europeus e orientais, e essa falta de articulação com o povo subsaariano foi uma das estratégias utilizadas pelo imperialismo não só no processo de apropriação de territórios, mas no processo de construção da história africana e disputa de narrativas.
Uma classificação regional importante, que vai além da ideia de África Saariana e Subsaariana é a seguinte:
A criação colonial do continente Africano
No século XIX, os europeus tinham demandas econômicas que levaram a necessidade de expansão por matéria prima, mão de obra e mercado consumidor, aumentando sua presença e atuação na África e Ásia. Um dos fatores que influenciou o interesse imperialista foi a grande riqueza natural encontrada no território africano. Devemos destacar os minérios e pedras preciosas em países como República Democratica do Congo e África do Sul. Golfo da Guine, Nigéria e Angola se destacam também por possuirem petróleo em seu território. Além disso, a grande quantidade de terras tropicais transforma o continente numa grande potência agrícola. O continente de modo geral se destaca pela riqueza mineral presente em seu território.
Além das demandas econômicas, é importante ressaltar que o racismo foi um importante motivador para a forma como as relações entre europa e áfrica se estabeleceram. Existem inúmeros escritos daquela época que costatam uma visão europeia sobre os povos africanos, os descrevendo como inferiores, preguiçosos e selvagens. Essa visão, demonstra uma tentativa de desumanização das populações africanas, revelando também a intencionalidade política de legitimar as ações que se realizavam naquele território.
Sobretudo entre 1830 e 1880 o domínio europeu sobre terras Áfricanas se expandiu consideravelmente. O processo que ficou conhecido como Partilha da África começou por meio de políticas conhecidas como imperialistas.
Pode-se dizer que inicialmente, a atuação do império Francês sobre a Argélia e posteriormente a Tunísia, Senegal, Guiné, Níger, Daomé, Mali, Marrocos, Madagascar, entre outras nações. A Inglaterra também exercia domínio, estabelecendo um sistema de protetorado sobre o Egito, e anexando regiões como Sudão, Uganda, Quênia, Serra Leoa, Nigéria e Somália. Alguns países europeus no entanto, como Itália e Alemanha haviam passado por processos de unificação tardia.
Para evitar conflitos internos e fortalecer o continente europeu como uma totalidade, houve a Conferência de Berlim, que visava estabelecer um acordo pacífico para a disputa por territórios africanos. Esta conferência oficializou a chamada partilha da África e criou uma divisão territorial com base nas zonas de exploração de onde os europeus extraíam recursos para suas indústrias.
O grande poder bélico dos Europeus foi parte da estratégia de dominação. Além disso, as divisões territoriais desarticulavam os povos, colocando no mesmo território etinias, linguas e culturas diferentes, o que dificultava a articulação dos povos africanos. A resistência cultural nesse período foi muito importante para os africanos, sobretudo a partir dos esforços dos colonizadores de impedir práticas culturais e o exercício da identidade daqueles povos. Os movimentos populares de resistência a esse processo, sobretudo a Conferência de Berlim, só cresciam no século XIX, lutando contra o domínio colonial. Os europeus acreditavam no processo civilizatório dos africanos, desconsiderando sua organização social, costumes, crenças, cultura e desrespeitando sua soberania territorial. Importantes movimentos que devem ser citados são a Frente da Libertação Nacional na Argélia, o Movimento Popular pela Libertação de Angola e a Frente Nacional de Libertação de Angola, a Frente de Libertação de Moçambique, entre muitos outros só alcançaram vitórias significativas, como a independência de várias colônias no pós 2ª GM, quando a Europa já estava enfraquecida no cenário geopolítico.
Fato é que o processo de divisão territorial tal como se estabeleceu e foi reconhecido gera fragilidades e fomenta conflitos. São etinias e culturas muito diferentes no mesmo território nacional. Trata-se de populações com diferentes religiões, valores, línguas, etinias, culturas, hábitos, pertencendo a mesma unidade nacional. Pense que a África é muito grande. Só o deserto do Saara é maior que o Brasil inteiro. A distância implica numa grande diversidade sociocultural. Toda diversidade desse território demandava uma outra divisão territorial.
Não se esqueça de que a divisão foi realizada de forma estratégica para desarticular o poder de organização e resistência dos povos. Assim como no período escravocrata, colocavam povos diferentes que muitas das vezes não falavam a mesma língua nos porões dos navios para reduzir a resistência e a capacidade de organização. Era comum também que o regime colonial fomentasse que o grupo minoritário dentro da região detivesse o poder local, o que instigava o conflito e o aumento de regimes ditatoriais, pela falta de aceitação da legitimidade do governo por parte dos outros povos. A frágil organização política facilita tambem maior atuação estrangeira sobre os territórios. Atualmente, o conflito por recursos e soberania gera casos extremos de guerras e conflitos internacionais. Essas guerras geram também campos de refugiados, que muitas das vezes parecem até mesmo cidades, dado o tamanho e a extrema pobreza e vulnerabilidade social que grande parte da população se encontra. A dificuldade de estabilidade territorial cresce também a atuação de milicias armadas, sendo que essas questões que perpassam e motivam uma gama de conflitos no continente.
Alguns conflitos importantes
O caso da Angola e a influência externa
Os países africanos passaram tardiamente pelo processo de formação enquanto Estado, isso porque em um contexto de colonização do continente, no século XX, estes eram colônias e as metrópoles europeias em crescente avanço industrial buscavam recursos para tal empreitada. Um exemplo é Angola, que foi colônia de Portugal até 1975, quando, após uma guerra civil, que perdurou até 2002, alcançou a independência, mas o cenário posterior foi de conflito pelo poder entre dois grupos políticos envolvendo indiretamente EUA e URSS visto que era o cenário da Guerra Fria. Tratou-se da disputa política entre Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA). A Angola entrou em guerra civil de 1975 a 2002. Estamos falando do processo de descolinização de um país que detêm uma das maiores reserva de petróleo do mundo. OS EUA tiveram forte atuação no financiamento dessa guerra, em grande parte por seu interesse de não deixar o governo local se estabelecer a ponto de conseguir explorar seu próprio petróleo e manter sua influência na região. O resultado deste conflito é que Angola é o país que mais tem minas espalhadas em seu território e o número de mutilados também é elevado.
O caso do Darfur (Sudão)
Na área do oeste do Sudão, Darfur, a população não árabe se rebelou contra o governo que era a favor dos árabes (janjawid). Além disto o conflito envolve a questão de acesso aos recursos, pois a população árabe, que vivia em maioria na área norte do país, área desértica, retirava da área sul, com grande cobertura vegetal e onde residem grande parte dos cristãos, recursos para se utilizarem destes.
O conflito em Ruanda
O país composto por uma minoria Tútsis e uma maioria Hutus foi marcado por um conflito étnico pelo poder após a Bélgica abandonar o país, sua antiga colônia, situação na qual os Tútsis dominavam politicamente o país e contestando isso o Hutus se rebelaram e tomaram o poder. Em 1990 os Tútsis tentam retomar o poder gerando novos conflitos que têm fim 1993 com um acordo de paz e a manutenção dos Hutus no poder. Mas no ano seguinte um avião com o presidente é derrubado gerando assim uma nova instabilidade pois a culpa recaiu sobre os Tútsis que foram massacrados no chamado genocídio de Ruanda através da atuação de extremistas Hutus.
O conflito em Mali
O Mali faz parte do Sahel, faixa biogeográfica de transição entre África do Norte e Subsaariana, e era colônia da França e que após a independência se tornou um dos países com uma grande extensão territorial e um dos piores IDH do mundo. O povo (Tuareg), fortemente ligado às atividades agrárias, foi perseguido pelo governo, que defendia mais os interesses da região sul, população essa não islâmica, e tiveram apoio de países do norte da África, como a Líbia, treinando militarmente o povo. Em 2012 ocorre a Rebelião Tuaregue. Na ocasião três cidades do norte foram tomadas e eles chegaram a declarar um Estado independente e deram um golpe militar e derrubaram o presidente. A preocupação internacional em relação à este conflito no Mali é porque ele foi engendrado por um grupo de origem islâmica que tinha relações com um braço da Al Qaeda na África e que poderia se alinhar com os grupos terroristas. Com a interferência da França o conflito teve fim.
Sudão do Sul
O Sudão do Sul é um país de formação nacional recente, tendo conquistado sua indenpendência em 2011, por meio de um referendo no qual 98,83% da população votou a favor. A origem dessa guerra se dá na separação de fronteiras africanas estabelecida anteriormente por povos europeus, no qual pessoas de etinias, religões e culturas muito distintas ficavam no mesmo território. A disputa por recursos nesse sentido se dá de maneira inevitável.
O próprio referendo que aprovou a independência estava prevista no acordo de paz de 2005 que encerrou décadas de guerra civil. A população sudanesa do sul é de maioria cristã ou animista e se sentia discriminada pelo governo centralizado em Cartum, no Sudão, de maioria muçulmana. Esse governo tinha como objetivo impor a lei islâmica na região. O governo de Cartum no entanto reconheceu rapidamente a nova nação, num processo estavel de secessão. No entanto, com a independência, diz-se que o que era uma guerra civil se tornou um conflito internacional, uma vez que houve muita dificuldade em estabelecer as fronteiras entre os países, disputando recursos como o petróleo. Em dezembro de 2013, ainda grupos de milícias começaram a atuar na região com confrontos marcados e massacres de caráter étnico. Isto ocorreu porque o então presidente Salva Kiir destituiu o seu ex-vice Riek Machar, acusando-o de tramar um golpe. Kiir pertence a um grupo étnico chamado de dinka, representado cerca de 15% da população do país, enquanto Machar pertence ao grupo dos nuer, representando 10% da população. Apesar desse racha político que se tornou um conflito étinico, ambos faziam parte do exército de libertação do povo sudanês. Um país que declara independencia no meio de uma guerra já indica certa instabilidade econômica. Nesse caso, a situação se agravou ainda por uma inflação anual de 800%, e uma moeda muito desvalorizada. O Sudão detinha ainda toda a infraestrutura de produção de petróleo, que correspondia a 98% da economia do sudão do sul, que hoje vive uma economia de subsistência.
Esse conflito armado com perseguição étnica e fome gerou uma crise de refugiados na qual estima-se que cerca de 3 milhões de pessoas se deslocaram para países vizinhos como Uganda, Quênia, Sudão, Etiópia,
República Democrática do Congo e República Centro-Africana. Além disso, 7 milhões de pessoas dentro do país precisam de assistência humanitária. Em 2018 essa crise de refugiados se tornou a pior do mundo a níveis de crescimento, superando até mesmo o conflito da Síria.
Serra Leoa
Serra Leoa é um dos países mais pobres do mundo e mais ricos em diamantes, e hoje é palco de guerras e conflitos. Se antes o colonialismo e imperialismo era direto, com guerras e conflitos declarados, hoje muitos dos países libertos contam com outros países, empresas e governos subsídiando o governo local, numa abertura econômica praticamente obrigatória e com alto grau de dependência externa, sobretudo em função da infraestrutura e desenvolvimento. Só que essa abertura estabelece muitas relações de exploração e pobreza. Em virtude da exploração e conflitos, os recursos naturais acabam financiando conflitos armados na região.
Africa do Sul e o Apartheid
A África do Sul é o país mais rico do continente, mas mantêm altos índices de concentração de renda. Mesmo antes do Apartheid, a população branca concentrava grande parte dos meios de produção e a tensão entre raças já se fazia presente no território. Foi em 1948, já vislumbrando o processo de descolonização pela Guerra Fria e o enfraquecimento da Europa no cenário geopolitico, que, nesse contexto, a segregação passa a ser institucionalizada como política oficial. O clima de violência se estabeleceu fortemente no país. Houveram chacinas por parte do governo para reprimir protestos antes mesmo deles acontecerem. Houveram conflitos como o Levante de Soweto, onde a repressão policial contra estudantes negros que iriam realizar um comício contestando a qualidade dos serviços de educação e saúde oferecidos à população negra, e o massacre de Sharpeville, repressão da polícia Sul-africana sobre manifestantes negros que realizavam uma passeata contestando a Lei do passe e que culminou em mortos e feridos. Naquele período, eram cerca de 2 milhões de brancos detendo 87% do território, contra 8 milhões de negros.
Nelson Mandela nesse contexto, era um nacionalista, advogado e político membro do Conselho Executivo. Acontece que com o regime do Apartheid, ele passa a entender que não havia como lutar ao lado do governo, e se une ao Congresso Nacional Africano, se tornando um braço armado pra lutar contra o estado. Apesar de ser inicialmente um pacifista, a situação de violência no país o fez entender que não se disporia de capacidade de lutar contra esse regime por meios não armados. Com atenuamento do conflito, ele acaba sendo presos perpetuamente. Na prisão, há relatos de que tentar enloquece-lo de diversas formas diferentes. A ídeia era abafar o líder do movimento e conter a resistência ao regime implantado, e, principalmente, manter os brancos no poder, de modo que a população negra, cerca de 70% à época, não podia votar.
Em 80 a situação se torna insustentável, o movimento ganha força. Nesse período, mais de 50mil pessoas já haviam sido mortas ou torturadas sem que o país tivesse em guerra oficialmente. A nível de contexto geopolítico, era também o fim da Guerra Fria e entrada do regime neoliberal no mundo, onde o estado se enfraquece.
Além disso, a pressão da ONU e demais instituições internacionais, somada a crise econômica e política instaurada leva a necessidade de consiliação. Em 1989 Pieter Botha, então presidente, sobre um derrame e deixa o cargo de líder do Partido Nacional para Klerk, um importante político que acreditava que o apartheid era insustentável. Klerk propõem uma negociação e promete libertar Mandela, assim como estabelecer um acordo para acabar com o Apartheid. Pela capacidade de resolver o conflito, eles ganharam o nobel da paz. Com a reinserção da maioria da população nas dinâmicas econômicas e sociais, a África do Sul voltou a apresentar bons índices de desenvolvimento. Importante destacar a Copa do Mundo de 2011 e a inserção do país nos BRICS, o que demonstra os avanços que vem ocorrendo no país.